Apesar de
condicionados por currículos oficiais deficientes, os manuais escolares de
História podem ser instrumentos eficazes para transmitir aos alunos uma visão
do passado que os ajude a formar uma cultura histórica pessoal e a desenvolver
aptidões críticas sobre a realidade do passado e do presente.
Vou
correr o risco de apresentar como exemplos de boas práticas livros por mim
editados (ou de que fui também coautor). Mas esta opção de risco tem a vantagem
de poder exemplificar os meus pontos de vista com “obra minha”, de que tenho a
obrigação de conhecer os fundamentos pedagógicos e didáticos e assumir a
responsabilidade dos resultados, aqui mostrados.
No caso
desta “página dupla”, podem observar-se os aspetos interdependentes que julgo
necessários a típicas páginas de estudo num manual do Ensino Básico (clicar na
imagem para abrir PDF, que convém visualizar em facing – as duas páginas lado a lado):
· As duas páginas (ou “página dupla”) que o aluno tem abertas
em qualquer parte do manual devem corresponder a uma pequena unidade de saber
(com grande coerência interna) e, preferencialmente, a um tempo letivo (ou
“aula”). Isto implica não ter muito texto informativo, demasiados documentos ou
atividades em excesso para o tempo disponível (atualmente 45 a 50 minutos).
· O texto informativo é o fio
condutor desta pequena unidade de
saber. Neste caso, é previamente enquadrado por um título e por uma
localização espácio-temporal (ver cabeçalho da 1.ª página). Este texto deve ser
lido e interpretado em sala de aula, sob orientação do professor. De contrário,
o aluno fica abandonado a si mesmo, não vai utilizar todo o potencial
informativo do texto e vão acentuar-se diferenças cognitivas e de aprendizagem
entre os alunos (proporcionais às diferenças de hábitos e condições de estudo
que já trazem consigo). Corresponde à secção de página “Aprendo…”.
· O texto informativo
deve estar resumido em esquema gráfico
(ver secção “Sintetizo…” no fim da
1.ª página). Este resumo gráfico permite apreender o essencial do texto
informativo num golpe de vista. Pode ser utilizado pelo aluno antes ou depois
da leitura do texto e serve sobretudo para explicitar as relações fundamentais
entre os principais dados do texto e entre estes e os conceitos.
· O texto informativo
está assente em conceitos – estes
estão graficamente diferenciados e definidos na página (neste caso, incluídos
no resumo gráfico da secção “Aprendo…”).
O conceito num texto informativo não é meramente uma palavra mais difícil que
necessita ser descodificada ao aluno. O conceito é uma palavra-chave, um marco
que sintetiza e agrega conhecimento. Por essa razão, se bem entendido, o
conceito vai funcionar na mente do aluno como um instrumento de relacionação e
agregação instantânea de elementos informativos diferentes e permitir-lhe
progredir na aprendizagem. Isto porque, uma vez dominado na sua significação,
vai poder ser aplicado pelo aluno a novas situações, não previstas no manual
(ou que apareçam noutra parte do manual). Por esta razão, qualquer conceito
deve ser definido logo na sua primeira ocorrência no texto (se, por alguma
razão, a definição não é conveniente nessa parte do livro ou da matéria, o seu
uso deve ser aí evitado).
· O texto informativo
deve estar articulado com as fontes ou
documentos escritos e iconográficos apresentados, de modo que estes sejam
extensões e/ou ilustrações do texto informativo. Já foi dito antes: os
documentos são subsidiários do texto informativo e não o contrário. O fio
condutor da aprendizagem é o texto informativo; logo, os documentos devem ser
remetidos a partir do texto informativo. A função dos documentos é ilustrar
e/ou fundamentar afirmações do texto informativo. A importância da análise
(observação, leitura e interpretação) dos documentos decorre desta sua função
de ilustração e fundamentação do fio condutor da aprendizagem patente no texto
informativo. As boas práticas na seleção e edição destes documentos terão de
ficar para tema de um próximo texto.
· As atividades de página têm de incidir tanto sobre a interpretação do
texto informativo quanto sobre as fontes históricas ilustrativas. A presença
destas atividades é o que distingue um manual escolar de outro tipo de livro
que veicule conhecimentos. Estas atividades, antes de qualquer propósito de
avaliação pura e “hierárquica” (docente/discente), servem para o aluno fazer um
controlo da sua própria aprendizagem. Isto tem consequências importantíssimas
no modo como as atividades de página devem ser concebidas. Elas não servem
(apenas ou fundamentalmente) para aferir se o aluno “reteve conhecimentos” –
expressão muito usada. Não servem sequer para aferir, numa preocupação mais
próxima dos construtivistas, se eles são capazes de operacionalizar
competências (skills). Elas servem,
pelo contrário, para conduzir o aluno àquilo que é essencial na informação que
lhe foi transmitida na “página dupla” – no texto informativo, auxiliado pelos
documentos. E por “informação” não se entende aqui um conjunto de dados ou
“factos”. Entende-se ligações lógicas (sequenciais ou de causa/efeito)
auxiliadas por conceitos. Em boa medida, pode dizer-se que as atividades de
página servem para o aluno conferir se entende plenamente o resumo da matéria
que lhe é apresentada no esquema gráfico da secção “Sintetizo…”.
Nos dois
textos seguintes, teremos de ver o que é um bom texto informativo e o que são
atividades apropriadas.
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