sexta-feira, março 31, 2006

Há mais Hayeks na Terra...


A propósito disto, há a lembrar que, ainda Salma era uma criança, já em 1983 outras Hayek muito faziam nos palcos pela ordem espontânea. Falo de Julie Hayek, miss USA 1983 (na foto e ver aqui).

Nada de novo (para lá da raia)?


O novo Estatuto da Catalunha (consultar aqui), que alguns já vêem como a antecâmara de uma independência, até parece moderado em aspectos sensíveis como a questão linguística (ver artigo 6.º, s. 2) e a articulação com as instituições do Estado Espanhol (por exemplo, a disposição adicional primeira). Existem várias referências à Constituição Espanhola e parece claro, no texto, que esta rege o Estatuto. Da mesma forma, não havendo qualquer referência às questões da Defesa e dos Negócios Estrangeiros, presume-se que essas funções de soberania são desempenhadas pelo Estado Espanhol (nos termos da respectiva Constituição, não tendo o Estatuto de se lhe referir). No entanto, há aspectos das funções de soberania que levantam dúvidas. Assim, e embora as leis sejam promulgadas pelo presidente da Generalitat em nome do Rei (artigo 65.º), que nomeia o dito presidente (artigo 67.º), não deveria haver nas disposições iniciais uma discreta menção de lealdade da Catalunha à Coroa e ao Rei de Espanha? Depois, o Tribunal Superior de Justiça da Catalunha – cujo presidente também é, sob proposta, nomeado pelo Rei (artigo 95.º, s. 5) – deveria ser realmente (e em todos os casos) o tribunal de última instância na comunidade autónoma? São apenas dúvidas. Sem alarmismo. Nota final: o Estatuto é demasiado programático e reforça a consagração dos "direitos sociais"; mas isso é mal geral do Direito Público actual.

Publicado em L&LP, AP e CL

quinta-feira, março 30, 2006

[Campo Luminoso III] Se eu quisesse um dia ocupar um pedestal, conseguindo realizar essa vontade, logo no momento que para lá subisse já estaria arrependido. Assim pode o querer e a vontade, mas não mais.

EDMUNDO BUARQUE

quarta-feira, março 29, 2006

Jorge Borges de Macedo, 10 anos depois


A Câmara Municipal de Lisboa, que gasta umas somas jeitosas em eventos "culturais", está a homenagear o professor Jorge Borges de Macedo (1921-1996), dez anos após a sua morte. Já que nos vão assim ao bolso, ao menos que seja por boas causas, como esta. E, a propósito, na primeira conferência agora anunciada quem fala é um ilustre membro deste periódico (clicar na imagem para ler mais).

LEWIS WALKER

Uma nota (longa) sobre a poliarquia e a isonomia


De Orlando Vitorino ao Estagirita

Orlando Vitorino, em Refutação da Filosofia Triunfante (Lisboa: Teoremas, 1976, pp. 200-204), afirma que a poliarquia é a «reunião do que é realizável nas “formas puras” da monarquia, da aristocracia e da democracia» e, nas pp. 165-173, aborda as três formas virtuosas de governo e a sua degradação nas três formas corrompidas. Na verdade, no capítulo XIV da Política, em que abordou «as virtudes do justo meio», Aristóteles refere os males dos dois tipos mais comuns de governo, oligarquia e democracia, e a necessidade de os moderar com a consideração de uma via média que será tanto mais viável quanto mais numerosa seja a classe média entre pobres (que pendem para a democracia) e ricos (que pendem para a oligarquia); o Estagirita diz então, nos últimos parágrafos desse capítulo, que «a situação justa é reunir às instituições da oligarquia as instituições da democracia, propondo um salário a uns e impondo um contributo aos outros» – a este arranjo propriamente parece Aristóteles chamar politeia, regime misto que, tal como a monarquia e a aristocracia, considerava bom, ao contrário da tirania, da oligarquia e da democracia (cf. Scott Gordon, Controlling the State: Constitutionalism from Ancient Athens to Today, Cambridge, Mass., e Londres: Harvard University Press, 1999, p. 81).

Platão, Heródoto e Cícero

Também Platão considera as várias formas de governo (nomeadamente a fórmula tripartida monarquia-aristocracia-democracia que, segundo Scott Gordon, Op. Cit., pp. 80-85, remontava entre os Gregos aos pré-socráticos, foi também referida por Heródoto e era já comum no tempo de Platão e Aristóteles): na República, essas formas de governo são discutidas na defesa aí feita da aristocracia e também nas Leis que, embora “mais pluralistas e favoráveis à democracia” (Gordon, Op. Cit., p. 82), não chegam a defender explicitamente como melhor um regime misto – do grego mitke (“mistura”). O grego Políbio (c. 203-120 a.C.), no seu estudo sobre as instituições da república romana, parece ser o primeiro autor a identificar a noção de regime misto (mitke) com a conjugação das formas monárquica, aristocrática e democrática, que assimilou, respectivamente, aos cônsules, ao Senado e às assembleias populares de Roma (refere como antecessora da experiência romana a reforma de Licurgo entre os Lacedemónios).

De facto, em Roma, a assembleia popular (depois comícios) e o conselho aristocrático (depois Senado), assim como algumas magistraturas eleitas, já vinham do tempo da monarquia; todas estas instituições formavam o mos maiorum (costumes dos antigos ou constituição) de Roma mesmo depois do estabelecimento da república em 501 a.C. (que instituiu os cônsules e outros magistrados), tendo os plebeus conseguido dos patrícios, em 494 a.C., a eleição dos seus próprios representantes, os tribunos, e a publicação de um código legal (as Doze Tábuas) em 449 a.C. (a Lei I da Tábua XI dá-lhes direito de eleger os magistrados, de se pronunciarem sobre os assuntos mais importantes e de nomearem a acusação em casos de direito público).

Quanto ao antecedente em Licurgo, a sua reforma instituiu um regime de férreo igualitarismo que não se coaduna com o respeito aristotélico da propriedade e das diferentes classes de cidadãos (ver Plutarco, Licurgo, especialmente §§8-10). Já Sólon pode talvez ser visto como um reformador mais próximo da origem histórica da politeia. Sobre a diferença económica das suas reformas em Atenas (c. 594 a.C.) relativamente às de Licurgo em Esparta, ver Plutarco, Sólon, §16; neste sentido, em termos políticos, quis manter a influência dos ricos e abrir a participação aos pobres, dividindo a população em quatro tribos conforme a área de residência e a propriedade, proporcionando os direitos de participação nas magistraturas à riqueza, mas dando igual acesso às leis e aos tribunais (§18) e instituiu dois conselhos para moderarem e limitarem a assembleia popular: o Areópago, com funções judiciais e constituído por todos os ex-arcontes anuais, e o conselho dos 100 sorteados das 4 tribos, que propunha as leis à votação popular (§19).

O isolamento teórico de várias formas de governo – e em especial da sua apresentação tripartida, monarquia-aristocracia-democracia –, a contraposição de “formas puras” virtuosas e formas degradadas e a consideração de fórmulas mistas como na politeia aristotélica foram, assim, os elementos que Platão, Aristóteles e outros autores antigos legaram e dos quais emergiu posteriormente uma “arrumação” teórica mais sistematizada como a apresentada por Vitorino no princípio desta nota. De forma explícita, essa "arrumação" é já claramente formulada e defendida assim por Cícero, República I.45.69-46.70, onde usa a expressão permixta constitutio.

O debate constitucional inglês (século XVII)

Tal apresentação é já claramente assumida nos principais textos do grande debate político do século XVII inglês, desde o próprio Carlos I (His Majesties Answer to the Nineteen Propositions of Both Houses of Parliament, 1642) até Richard Hooker (6.º e 8.º livros de Of the Laws of Ecclesiasticall Politie, 1648), passando por A Treatise of Monarchy (1643) de Philip Hunton: ver David Wooton (ed.), Divine Right and Democracy: An Anthology of Political Writing in Stuart England, Harmondsworth: Penguin 1986. Mais tarde, até Algernon Sydney, na secção 16 («The Best Governments of the World Have been Composed of Monarchy, Aristocracy, and Democracy») do seu Discourses Concerning Government (1698), veio a dizer o mesmo – cf. Wooton, Op. Cit., pp. 417-445 (secção, pp. 426-430).

Curiosamente, sobre a legitimidade de mudar de governante em caso de desrespeito deste pelo pacto constitucional, um dos exemplos que Sydney dá (p. 429) é português: «Not long after, the Portuguese, conceiving a dislike of their king Ferdinand and his daughter, married to John king of Castille, rejected her and her uncle by her father’s side, and gave the crown to John, a knight of Calatrava and bastard to an uncle of Ferdinand their king»; claro que o caso português de 1640-1641 também se adapta a esta explicação e até talvez melhor. Mas Sydney fala da monarquia de uma forma que valoriza demasiado o seu carácter popular e desvaloriza a sua natureza hereditária, o que contrasta com a defesa da instituição, mais correcta, que fazem Hume e Burke.

De Burke a Hayek

Em Burke, p.e. nas Reflexões sobre a revolução em França (1790), esta apresentação tripartida dos regimes, das suas respectivas degradações e da conveniência da sua conjugação (como apresento aqui) é já perfeitamente clara e articulada com a questão da isonomia (ou rule of law) como condição da sua não-degradação; na Política, na parte onde é defendida a politeia, está implícita a defesa da isonomia por quanto Aristóteles considera que os males da democracia e da oligarquia derivam de se legislar em benefício de uma parte da sociedade – para ele, embora a estabilidade do regime seja também um objectivo, a defesa de um regime misto e a atenção recomendada aos interesses da classe ou estado médio de cidadãos devem-se essencialmente à necessidade de garantir leis iguais ou benéficas para todas as partes. Sobre a isonomia como raiz conceptual do rule of law, a melhor apresentação continua a ser a de Friedrich A. Hayek, The Constitution of Liberty, cap. 11 (“The Origins of the Rule of Law”), sb. §§2 e 3: segundo Hayek, o termo isonomia foi importado para Inglaterra a partir de Itália no fim do século XVI e com o significado de «equality of laws to all manner of persons» (John Florio, World of Wordes, Londres 1598 e tradução por Philemon Holland de Tito Lívio, Romane Historie, Londres 1600).

O termo derivará das reformas de Sólon, que tiveram a preocupação de fazer nobres e plebeus viverem sob as mesmas leis e é anterior a demokratia que, pelo contrário, exprimiu a exigência de participação igual no governo da polis; Heródoto considerou ainda a primeira como “o mais belo de todos os nomes de uma ordem política” e tanto Tucídides como Platão dão mostras de distinguir muito bem (senão de contrapor, como está também implícito no Estagirita) isonomia e demokratia. Segundo Hayek, durante o século XVII inglês, a influência dos escritores e oradores latinos (Tito Lívio e sobretudo Cícero) sobrepôs-se à fonte grega original e a isonomia foi relacionada também com a experiência da Roma republicana, nomeadamente com as Doze Tábuas (inspiradas nas leis de Sólon e distintas do que viria a ser o direito imperial que tomou forma no Código Justiniano – vejam-se as Leis I e II da Tábua IX, que são uma consagração clara da isonomia); foi através dos autores renascentistas italianos que estes latinos entraram no debate político inglês do século XVII.

Conciliarismo e Du Plessis-Mornay

Scott Gordon, Op. Cit., pp. 125-128, considera a obra Vindiciae contra tyrannos (1579), atribuída ao líder huguenote Philippe du Plessis-Mornay, uma charneira na história da teoria política ocidental por quanto «in stressing the role of the Estates and lesser magistrates in judging, constraining, and if need be organizing rebellion against the monarch (...) there is a third possibility [entre o governo absoluto de Bodin e Hobbes e a rebelião]: a regime in which political power may be controlled by being shared among the monarch, representative institutions, and lesser magistrates», p. 127; esta teorização não conseguiu florescer entre os próprios huguenotes, mas foi conhecida em Inglaterra, onde foi traduzida em 1589 e reeditada, sintomaticamente, em 1640 e 1689.

No cap. 4, no qual esta referência a Mornay aparece, o autor chama ainda atenção para o facto da reflexão sobre o “governo misto” ter começado no interior da Igreja latina, com o chamado movimento conciliarista, que recuperou os argumentos dos clássicos (o concílio de Constança, em 1414-1418, que encerrou o Grande Cisma, foi uma vitória dos canonistas e teólogos que defenderam, como o cardeal Pierre d’Ailly, que o colégio de cardeais e essas reuniões magnas eram os contra-pesos aristocrático e democrático do poder monárquico do papa); só depois o debate foi “secularizado”, mas, na Igreja Católica na época moderna, segundo Gordon, o modelo bodiniano acabou por se impor até à actualidade (reforçado em 1870). Outra nota: é de registar em Mornay a teoria do “duplo contratualismo”, segundo a qual a comunidade tem um contrato primeiro com Deus e um contrato segundo com o príncipe, i.e., o poder constituído.

Mornay, que assinou a Vindiciae como Stephanus Junius Brutus, o Celta, era um leitor profundo de Cícero, que variadíssimas vezes cita. Uma das importantes questões que estabelece é sobre a propriedade dos súbditos, que considera permanecer privada e sua apesar de toda a delegação de poder no contrato com o príncipe; outra é a grande importância dada ao papel dos pares do reino e dos magistrados nas suas relações de transmissão, limitação e complementaridade do poder do príncipe. Influenciou Hugo Grócio, seu leitor, e foi um proponente sistemático da tolerância religiosa (ver a edição de George Garnett, Cambridge University Press, 1994).

A posição de Locke quanto à poliarquia na base da posição de Burke

Que a «monarquia mista» de Burke era doutrina Whig que remontava claramente a Locke, no espírito do que defende Frederick A. Dreyer (Burke’s Politics: A Study In Whig Orthodoxy, Waterloo, Ontario: Wilfrid Laurier University Press, 1979, passim) parece inegável. Lois G. Schwoerer («Locke, Lockean Ideas, and the Glorious Revolution», Journal of the History of Ideas, vol. 51 n.º 4, Out.-Dez. 1990, pp. 531-548, especificamente na p. 540) cita uma carta de Locke de 8 de Fevereiro de 1689 ao seu amigo Clark, na qual é claro que rejeita a ideia de um começo de novo da arquitetura política inglesa, recomendando «restoring our ancient government […] the best possibly that ever was if taken and put together all of a piece in its original constitution», usando assim uma linguagem “histórica” estranha aos seus escritos teóricos, mas não tanto aos primeiros whigs, como Shaftesbury; Locke apoiou a Declaration of Reasons de Guilherme de Orange (apesar de reservas que pudesse ter sobre alguns pontos, nomeadamente a tolerância para os católicos), bem como a sucessão conjunta do príncipe com a sua mulher Mary, o que reforçava a continuidade dinástica.

Locke foi provavelmente de opinião que, com a fuga de Jaime II, não chegara a ocorrer uma quebra ou dissolução do governo e do pacto deste com a sociedade, patente no facto de se ter imediatamente reunido em Londres um conjunto de pares para prevenir essa eventualidade (Schwoerer, p. 541, apud Robert Beddard, A Kingdom Without a King: The Journal of the Provisional Government in the Revolution of 1688, Londres 1688). Locke reconhece no Segundo Tratado [cap. XIX, §223], sem o lamentar, que, apesar da instabilidade do século XVII, o povo «still brought us back again to our old Legislative of King, Lords and Commons», ideia que reforça em texto de 1695 a um membro do Parlamento (Old England’s Legal Constitution) no qual faz um exercício histórico, apoiando-se no discurso de Isabel I sobre os monopólios (1601), que considera modelar, que conclui pelo exercício constitucional da prerrogativa real limitada pelas duas câmaras do Parlamento (o que leva Schwoerer a deduzir, p. 542, que «the government Locke favored in 1689 […] was a mixed monarchy of king, lords and commons – no new scheme» e que, portanto, a sua posição diferia claramente de radicais e republicanos, por muito que com estes pudesse coincidir em aspetos de política eclesiástica).

Locke cita ainda, no Segundo Tratado, como autoridades abonatórias das suas ideias, sempre com Hooker, o rei Jaime I no seu discurso de 1603 ao Parlamento (cap. XVIII, §200) e Henry de Bracton (f. 1268) e Sir John Fortescue (f. 1476), grandes defensores da lei natural na jurisprudência inglesa (cap. XIX, §239).

O debate constitucional português (século XIX)

Se a ligação à tradição clássica, directamente ou através dos seus intérpretes latinos, foi fundamental para clarificar os termos do debate político e constitucional inglês do século XVII, é perfeitamente legítimo que o “debate” constitucional português do princípio do século XIX se ligue à posteridade de intérpretes que teve a dita tradição clássica, em particular aqueles de que aqui se faz derivar a genealogia dos princípios da Carta; é evidente que nesse acto está pressuposta a validade universal da tradição clássica e dos seus intérpretes e aperfeiçoadores modernos, de que deriva directamente a tradição jurídico-política liberal.

Mais do que “enxertia” de elementos alegadamente “estranhos” ao corpo da tradição constitucional histórica portuguesa, a presença quer dos elementos do debate da tradição clássica quer dos princípios depois consagrados na Carta, foi uma assumida base de reflexão e regeneração do corpo constitucional português, de modo a ultrapassar-se a crise a que este chegara no princípio do século XIX. Não deixa de ser curioso que os cartistas portugueses tenham deixado expressa a ideia de que, na sua origem e primeiros séculos, o nosso corpo constitucional – embora de forma obviamente inconsciente e imperfeita – tivesse presentes suficientes elementos poliárquicos para criar vigor e espírito de liberdade no jovem reino; e que uma concentração posterior do poder tenha sido a causa remota da crise a que se chegara no seu tempo (ver, além de Herculano, por exemplo, o discurso às Cortes da Infanta Regente em 1826 (aqui) e a introdução de João Oliveira de Carvalho à sua tradução de Locke em 1833).

segunda-feira, março 27, 2006

Isto é muito pior que o "Maio de 68"


Aquilo a que estamos assistir em França é um "Maio de 68" sem fim, mas pior que os acontecimentos de 1968. Por um lado, como é defendido aqui, é verdade que este tipo de desordens públicas faz parte da vida política francesa há muito tempo. É um género de escape de um sistema político centralizado e proteccionista e que, para lá da retórica inclusiva, tem privilegiados barulhentos e prejudicados confundidos. Mas o problema agora é que o Estado Social francês está prestes a entrar em ruptura, o que é o oposto da situação económica de 1968. Nesse ano, a conversa era puramente ideológica e devia-se a uma explosão de jovenzinhos aborrecidos com o conforto e a afluência dos "Trinta Gloriosos"; hoje, há na sociedade francesa problemas reais - e muito graves - que não encontram qualquer resposta sensata de políticos fracos (quando não imbecis) e de uma opinião pública completamente empaturrada de tanta demagogia que já não consegue pensar (e reagir) para além dela.

sexta-feira, março 24, 2006

Oh, valha-me Deus...


Um coração destroçado que não consegue evitar a ameaça velada... E fica a curiosidade sobre como seria a música. Ou talvez não fique (talvez seja melhor não saber, como tantas vezes na vida)... De qualquer forma, os anos 70 ficam responsáveis por mais um... fenómeno destes.

quinta-feira, março 23, 2006

As palavras...



But we are the AIR Force, you see? :)

História: 1.º livro preferido


Tal como os outros dois (que podem ser vistos como adendas a este), "The Rise of the West: A History of the Human Community" é a melhor história global que conheço, aliando o esforço de tudo interligar à informação essencial sobre cada tempo e espaço. Escusado será dizer que William H. McNeill é o meu historiador preferido...

História: 2.º e 3.º livros preferidos

terça-feira, março 21, 2006

De novo, Ron Paul...


Nos anos 80, o presidente Ronald Reagan, perante críticas de que era alvo, fez uma afirmação célebre em defesa das suas políticas: THIS IS NOT A QUESTION OF RIGHT AND LEFT, BUT OF RIGHT AND WRONG. Os liberais clássicos deveriam ter isto mais presente antes de alinharem nas lutas partidárias do sistema (nos Estados Unidos e não só) como se toda a razão estivesse com um partido e nenhuma com o outro – pelo menos é o que parece. Até porque, já que há a graça de existir pelo menos uma sólida voz independente no "bando da razão", que a ouçam um pouco mais. Por exemplo, sobre este assunto (ver mais aqui).

Debate mais sereno s.f.f.


A questão que levanto perante este cartoon é: porque os Iranianos, alegadamente, enforcam homossexuais e dissidentes, vamos atacá-los? E os defensores do ataque ficam com a razão só porque os militantes radicais ridicularizados no cartoon têm um discurso contraditório? Será este discurso dos radicais relevante para a questão em debate, que é: como lidar com a política nuclear do Irão? Que tal deixarmos de levantar areia e polémica fácil e regressarmos ao debate sereno (como, por exemplo, aqui?).

segunda-feira, março 20, 2006

C.D.S.: pede-se juizinho...


Faço minhas as palavras de Rui A. na sua referência ao "churrasco" que está em vias de torrar de vez o C.D.S. Esta oposição pouco leal a um líder legítimo por gente com quem eu até simpatizava, mas que não soube manifestar vontade e organizar-se no último congresso, é um espectáculo lamentável (e de tirar as últimas ilusões a espectadores ainda interessados, como eu).

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Hinos do Novo Testamento (II): Lucas 1:68-79


(BENEDICTUS): 68 Bemdito o Senhor Deus de Israel, porque visitou e remiu o seu povo, 69 E nos levantou uma salvação poderosa na casa de David seu servo. 70 Como falou pela bôca dos seus santos profetas, desde o princípio do mundo; 71 Para nos livrar dos nossos inimigos e da mão de todos os que nos aborrecem; 72 Para manifestar misericórdia a nossos pais, e lembrar-se do seu santo concêrto, 73 E do juramento que jurou a Abraão nosso pai, 74 De conceder-nos que, libertados da mão de nossos inimigos, o serviríamos sem temor, 75 Em santidade e justiça perante ele, todos os dias da nossa vida. 76 E tu, ó menino, serás chamado profeta do Altíssimo, porque hás-de ir ante a face do Senhor, a preparar os seus caminhos; 77 Para dar ao seu povo conhecimento da salvação, na remissão dos seus pecados; 78 Pelas entranhas da misericórdia do nosso Deus, com que o Oriente do alto nos visitou; 79 Para alumiar aos que estão assentados nas trevas e sombra da morte; a fim de dirigir os nossos pés pelo caminho da paz.

sexta-feira, março 17, 2006

Como prevenir a gripe das aves...

[Campo Luminoso II] As palavras são amigas da sabedoria, mas os gestos da verdade. Construímos a nossa imagem com grandes palavras e denunciamo-nos com pequenos gestos. Como isto nos põe no nosso lugar!

EDMUNDO BUARQUE
[Campo Luminoso I] A blogosfera é uma feira de vaidades, mas isso era espectável. O pior é que as vaidades resplandeçam apenas no acessório, consumindo-se no comentário do fait-divers.

EDMUNDO BUARQUE

quinta-feira, março 16, 2006

Atalho


Esta resposta a um teste de matemática é uma boa ilustração do que se pode entender por "atalhar caminho"...

Classificados


Um anúncio como este diz mais de quem o coloca no jornal do que diz do visado...

Quadro preferido


Não sei se tem sentido ter-se um "quadro preferido". Mas eu "tenho" este. É o RETRATO DE UM CANONISTA, de Quentin Massys (um dos nomes grandes da Escola Flamenga), datado de c. 1515. É pintado a óleo sobre madeira e pertence à colecção do Grão-Duque do Liechtenstein (sediada em Vaduz, capital do principado). Não tenho a certeza de saber explicar a minha relação com este quadro.

Sobre a fé cristã e os dois "vencidismos"

"Vencidos da Vida" e "Vencidos do Catolicismo". A primeira expressão designa o célebre grupo do Bragança que, no fim do século XIX, se reunia para discutir a suposta decadência do País e o modo como este (também supostamente) os ignorava. A segunda expressão, inspirada na primeira, foi cunhada num célebre poema de Ruy Belo e designa aqueles que acreditaram, dentro do catolicismo romano, numa "outra Igreja", sentindo-se também vencidos, mas pela Igreja real.

"Vencidos" uns, "vencidos" outros, quase cem anos depois. Eis um paralelo que nunca me ocorrera fazer, mas que foi defendido, entre muita outra coisa estimulante, num seminário recente (e regular) que junta gente interessada em história religiosa contemporânea. O motivo foi o estudo da personalidade de Ruy Belo e o proponente foi Jorge Revez. O que é interessante é que, como o Jorge notou, estes "vencidos" são tudo menos vencidos. Não se trata afinal, julgo eu, de "vitórias morais", mas de autênticas vitórias.

Os "Vencidos da Vida", independentemente de não se sentirem içados ao protagonismo de que se julgavam merecedores, moldaram a visão que as cabeças pensantes das gerações seguintes vieram a ter do País. Para o bem e para o mal. E não se imagina que maior vitória possam ter as glórias intelectuais no mundo. Já os "Vencidos do Catolicismo", expressão que João Bénard da Costa, em livro de crónicas homónimo, assumiu em nome do "grupo", tornaram-se, entre a opinião dominante (católica romana e não só) num género de bitola para aferir a autenticidade (e uma difusa "adequação ao mundo") da fé no espaço religioso maioritário que é entre nós o catolicismo romano.

Neste paralelo entre os dois "vencidismos" há duas linhas de aparente continuidade ou repetição. Uma: um embate com o catolicismo dogmático e a sua expressão institucional na Igreja hierárquica e respectivas mediações sacramentais. A outra: uma inquietação provocada pela interiorização da visão do socialismo relativamente àquilo que é percepcionado como "desigualdade" e "injustiça" na sociedade.

Na primeira linha de continuidade pode propor-se que o embate com a Igreja institucional se deve a uma "deslocação do religioso" ou, mais propriamente, das expectativas dos sujeitos que deixam de obter satisfação no quadro religioso vigente e "regulado" pela instituição. Em ambos os "vencidismos", os apelos mundanos introduziram claramente tensões que tiveram dificuldade de continuar acomodadas num quadro teológico-moral sentido como rígido e estreito (estes apelos mundanos são variáveis, "públicos" e/ou "privados"). Outra tensão, que julgo ser igualmente repetida, é entre o quadro teológico dogmático e o apelo de determinadas correntes filosóficas "modernas" a que os sujeitos aderem – no primeiro "vencidismo" o hegelianismo, o positivismo e os socialismos pré-marxistas; no segundo "vencidismo" os existencialismos e o marxismo. Estes dois elementos justapõem-se ou entram em choque e, em conjunto com a primeira tensão (mais existencial ou vital), motivaram experiências pessoais tanto mais dramáticas quanto eram vividas com maior radicalidade. Daí as rupturas, muitas vezes vistas de fora como evoluções para a "descrença" ou o ateísmo.

Saber o que resta da mundividência abandonada na obra e no testemunho posteriores destes sujeitos é uma questão que tem sido colocada por António Matos Ferreira para o primeiro "vencidismo" (sobretudo em Eça de Queirós e Oliveira Martins) e é agora colocada por Jorge Revez para o segundo "vencidismo" (em Ruy Belo). Que o "religioso" permanece depois das tensões transformadoras não há dúvida. É que o religioso permanece sempre. Que a transformação referida implica uma "deslocação do religioso", patente na importância que determinadas ideias ou palavras adquirem no discurso dos sujeitos, também parece claro; mesmo quando (ou sobretudo quando), como em Ruy Belo, se dá uma consciente substituição de palavras (que querem tornar clara no dizer uma evolução no sentir).

Mas, nessa "deslocação do religioso", o que resta então da mundividência abandonada? E qual o sentido da "deslocação"? Aqui, num acto de reflexão extremamente falível, parece-me que os significados das transformações individuais variam conforme o tipo de ligação que o sujeito tinha com a sua situação religiosa anterior. Quanto mais estivesse próximo, em consciência, do núcleo da fé cristã (mesmo envolvida na cultura eclesiástica e devocional católica romana), o Querigma, mais probabilidades tem de não romper essa fé por mais que recomponha, questione ou abandone a sua expressão institucional ou social. Pelo contrário, quanto mais dependente a sua adesão religiosa anterior estivesse dessa envolvência institucional e da sua sociabilidade mais provável se torna o que aparece publicamente como o "romper com a fé" ou a "perda de fé".

Ora, o que acontece entre nós no universo católico romano é que o peso da envolvência no sentido que os sujeitos dão à sua situação religiosa é muito grande (tal como acontece com todas as religiões institucionais hegemónicas em qualquer sociedade). E se a ruptura com essa envolvência for radical, a ténue ligação ao núcleo querigmático quebra-se com alguma facilidade. É isto que explica que os "desiludidos" com a orgânica eclesial abandonem a "fé". Na época contemporânea, a maior concorrência de fés e morais "seculares" aprofundou esta tensão e o fenómeno do "abandono", espalhando-os socialmente. Mas o que se pode perguntar nestes casos é se a "deslocação" essencial (de um ponto de vista cristão) não estava já feita, do núcleo para a envolvência. Uma "deslocação" muitas vezes herdada, recebida já no próprio ambiente envolvente.

A questão já referida do socialismo entra aqui. Ele manifestou-se, como simpatia ou inevitabilidade, nos dois "vencidismos". Mas porquê o socialismo? Mais uma vez num exercício reflexivo assumidamente falível, parece-me que a geração de 70 do século XIX e a geração de 60 do século XX viram no socialismo uma forma de preservarem, sob a transformação religiosa que sofreram, a saudade de uma sociabilidade orgânica e solidária que o catolicismo romano transportou durante séculos na nossa sociedade. Isto não é nenhuma novidade: alguns dos sujeitos de ambos os "vencidismos" levaram a sua auto-reflexão a uma conclusão semelhante. Da mesma forma, a expressão no socialismo desse solidarismo orgânico, mais ou menos institucional, já foi relacionado (por exemplo, por Matos Ferreira) com o peso histórico do devocionismo franciscanista no universo religioso português tradicional. Aí emerge uma mundividência refundada, na qual a superioridade moral da pobreza, a desconfiança da vida intelectual e o nojo pelo conflito moral e pelo negócio são a expressão massificada dessa transformação religiosa.

Esta "deslocação" pode tornar-se mais clara se virmos a sua articulação com o aspecto institucional. O que ocorreu nalguns elementos do primeiro "vencidismo" (do meu ponto de vista, claramente em Oliveira Martins) foi que transferiram da Igreja institucional e sacramental para o Estado burocrático e providente a função mágica de operacionalizar a organicidade solidária pretendida. O que uma estrutura clerical organizada fazia com a administração de sacramentos e o magistério pela disciplina moral que mantinha a unidade visível dos crentes, o Estado também poderia fazer, mutatis mutandis, com uma estrutura administrativa de burocratas providentes e docentes. O que Oliveira Martins calou foi a questão da salvação pessoal, que na construção teológica católica romana ainda encontrava expressão. Mas – e aqui há uma provocação – que espaço tinha realmente essa questão num ambiente em que a envolvência já tutelava a consciência? Terá Martins calado uma questão que já não "falava muito alto"?

A atenção a esta "deslocação" de expectativas da Igreja estabelecida para o Estado permite-nos talvez aferir o peso que tinha já a envolvência institucional (e respectiva sociabilidade) nas expectativas (religiosas) dos sujeitos dos dois "vencidismos". A atitude perante o socialismo e a forma mais ou menos institucional de que se revestiu pode, para tanto, ser reveladora. Nos casos das formas menos institucionais (ou "estatistas") dessa atitude não deveriam ser descurados os elementos de continuidade na sua "deslocação", uma vez que, no quadro tradicional, a eficácia da envolvência era compatível com instintos "anticlericais" que se podem metamorfosear em instintos "anti-burocráticos".


Chegados aqui, a questão fundamental é perguntar o que resta do núcleo da fé cristã nestas "deslocações do religioso" nos dois "vencidismos". Pelo menos em relação a alguns dos sujeitos antecipo que me poderiam responder que sobreviveu algo relacionado com a envolvência e a sociabilidade que, conforme os pontos de vista, seria ainda vaga ou essencialmente cristão. Quanto a isto, eu contraporia que só é ou permanece cristão quem diz essa palavra e nela se diz. As semelhanças e as variações não bastam para uma fé que se fez em torno da proclamação do Querigma. O que a "deslocação do religioso" põe a nu é se o sujeito era cristão por decisão interior ou por envolvência e sociabilidade. Porque os cristãos divergirão na tradução social e até eclesiológica que fazem da sua fé (por tradição, por evolução ou por ruptura), mas a adesão e a proclamação consciente do núcleo da fé é o que os distingue. Quem não chega a fazê-la ou deixou de fazê-la está fora.

[É relevante reflectir sobre o significado desta auto-explicação de uma representante do segundo vencidismo: «De uma relação individual e intimista entre o crente e Deus, evoluiu-se para uma procura de “Deus nos outros”, numa perspectiva em que a comunidade foi tomando a primazia e em que, no limite, ocupou o lugar do próprio Deus» (Joana Lopes, Entre as Brumas da Memória: os Católicos Portugueses e a Ditadura, Porto: Âmbar, 2007, p. 85). A ideia de evolução aqui expressa pode ser aceite se pensarmos em devoções pessoais de tipo tradicional que foram preteridas, mas sem se esquecer que o paradigma da Acção Católica e da “reconquista cristã da sociedade” (para não falar do catolicismo tradicional em geral) também era “comunitarista”; à comunidade eclesiástica “conquistadora”, estes católicos contestatários foram preferindo a sociedade a “conquistar” – ou uma nebulosa fusão de ambas. A ideia de a comunidade ou os “outros” tomarem o lugar de Deus pode ser uma boa descrição do sentido que tomaram as “rupturas com a fé” dos segundos vencidistas.]

As "deslocações do religioso" protagonizadas pelos dois "vencidismos" têm esta enorme e inesperada virtude: confrontarem-nos, não só com o seu sentido religioso próprio e variado, mas também com o sentido religioso daquilo a que se opuseram (e que abandonaram). No primeiro caso, a Igreja estabelecida tradicional (já então enquadrada no regime constitucional); no segundo caso, o catolicismo reorganizado no espírito da "reconquista cristã da sociedade". Mas, mais importante ainda, podem inspirar a reflexão em torno desta questão: que fé é essa que dizemos ter?

[P.S. Obrigado ao Jorge Revez, cuja comunicação brilhante inspirou esta reflexão.]

segunda-feira, março 13, 2006

Recordar Maria Teresa de Noronha


Para a generalidade dos apreciadores de fado, a grande voz feminina é Amália. Eu não nego que Amália seja uma grande voz. Mas é Maria Teresa de Noronha (1918-1993) quem me enche as medidas e me faz amar o fado. A grande senhora faleceu há treze anos, mas, graças a Deus, deixou uma obra discográfica extensa e recentemente reeditada. O seu género de interpretação, que ecoa o fado coimbrão, a dicção cristalina nas suas gravações, as músicas e as letras de excelente qualidade são as características do seu estilo imortal. Para um pequeno sabor de alguns dos seus melhores fados, pode ouvir-se aqui antes de encomendar.

EDMUNDO BUARQUE

O EXPOSITOR EVANGÉLICO (actualização)




Junto às sugestões que já aqui deixei, o sítio do Center for Reformed Theology and Apologetics. Trata-se de um espaço muito bom, com muitos recursos: documentos históricos da Igreja e uma secção de livros e textos on-line, desde Baxter a J. Gresham Machen. Veja-se, por exemplo o Catecismo Abreviado de Westminster.

Outro sítio muito interessante é o da não menos interessante Orthodox Presbyterian Church (Estados Unidos da América). A título de exemplo, veja-se um dos documentos da OPC disponíveis on-line: "A Igreja Presbiteriana Ortodoxa e a Maçonaria".

Neocon quiz (dedicado ao Carlos Novais)


No sítio do CHRISTIAN SCIENCE MONITOR está disponível um jogo interessante para tirarmos as teimas sobre uma dúvida que nos pode assaltar: em política externa norte-americana seremos neoconservadores? A vantagem é que, se não formos, nos arrumam noutro perfil (aqui). Eu gostei do meu, que deu assim:

"Based on your answers, you are most likely a REALIST. Read below to learn more about each foreign policy perspective.

Realists…
• Are guided more by practical considerations than ideological vision
• Believe US power is crucial to successful diplomacy - and vice versa
• Don't want US policy options unduly limited by world opinion or ethical considerations
• Believe strong alliances are important to US interests
• Weigh the political costs of foreign action
• Believe foreign intervention must be dictated by compelling national interest
Historical realist: President Dwight D. Eisenhower
Modern realist: Secretary of State Colin Powell."

Publicado em L&LP, AP e CL

Já começou o blá-blá-blá para libertário ver...


"MEMPHIS, Tennessee (Reuters) - Republican contenders for the White House walked a political tightrope at a weekend gathering of party activists - expressing solidarity with President George W. Bush while stressing differences over issues such as deficits and big government."

Serão realmente assim tão diferentes? Combateriam verdadeiramente o défice e o "big government"? Eu já não acredito. Aquando da inauguração da 1.ª presidência de George W. Bush, o "Cato Handbook for Congress", apesar de algumas esperanças vagas que não escondia, lembrava que os Republicanos, apesar das aparências e da retórica, tinham um passado pouco menos recomendável que os Democratas neste aspecto. Depois, foi o que se viu, excedendo todos os avisos do Cato Institute. Porque haveríamos agora de acreditar que seria diferente?

Publicado em L&LP, AP e CL

sexta-feira, março 10, 2006

Re: The Godfathers

É assim: primeiro, faz-se a observação de que os mafiosos são católicos devotos. Depois, conclui-se que a culpa pela violência que exercem é de quem? Adivinhem! Do "puritanismo" protestante que os impede de serem bons homens de negócios! Viva! Só um comentário: não será essa cultura mafiosa e a respectiva violência, que foi importada de Itália para a América, um produto de uma sociedade católica? Mas talvez a Sicília e o Mezzioggiorno sejam o que são por culpa do protestantismo WASP. Nunca se sabe...

quinta-feira, março 09, 2006

A Carta Constitucional na posse de Cavaco Silva


No discurso que fez perante o novo Presidente da República hoje empossado, o presidente da Assembleia da República, Jaime Gama, invocou (é certo que a par de António José de Almeida), o primeiro discurso de D. Pedro V perante as Cortes Gerais, depois de assumir a alta função de Rei. Nesse discurso de 1855, D. Pedro V exaltou as instituições representativas e as suas funções, explicando de que modo entendia, em articulação com elas, o seu próprio papel constitucional. Fez muito bem Jaime Gama de chamar a experiência constitucional do século XIX para património histórico-político do actual regime porque limitá-lo à I República, além de profundamente empobrecedor, é fazer esquecer que a história da liberdade civil e política moderna tem entre nós quase um século a mais que o regime "republicano" (i.e. sem chefia de Estado dinástica). Gama referiu ainda que o discurso do rei se seguiu ao juramento que fez, perante as Cortes, da Carta Constitucional. Foi bom ouvir uma referência à Carta nesta ocasião porque foi sob ela (a lei fundamental de maior longevidade em Portugal) que se teceu essa experiência de liberdade civil e política que neste regime devemos melhor estudar, reflectir, invocar e debater. Temos uma história constitucional cuja presença deve completar as referências teóricas num debate politico amadurecido.


Publicado em L&LP, AP e CL

quarta-feira, março 08, 2006

Ai que saudades da Câmara dos Pares...!

O Gabriel Silva do Blasfémias contrasta, e bem, a renovação do Patriot Act pelo Senado norte-americano com o chumbo da Câmara dos Lordes, no Reino Unido, à intenção do governo (e da sua maioria nos Comuns) de introduzirem o bilhete de identidade obrigatório. E pergunta até quando, nas democracias, os cidadãos continuarão a entregar aos governos poderes excepcionais que se tornam definitivos. A resposta, pelo próprio teor do contraste que propõe entre os dois acontecimentos, parece-me obvia: até as democracias voltarem a ter um bicameralismo a sério, com uma câmara alta não eleita e com todos os poderes para chumbar (em regime de reciprocidade) as medidas do monstro resultante da fusão entre os poderes executivo e "legislativo" (o governo saído de eleições e a sua maioria obediente na câmara baixa).

O rosto do Estado Social?


Convenhamos que, visto de certa perspectiva, é assustador. (recebido por e-mail)

O EXPOSITOR EVANGÉLICO




Folha do L&LP mantida pel'O Cristão Individualista no espírito inicial da sua colaboração neste blogue. Para a glória de Deus: Pai, Filho e Espírito Santo. Ámen.





ACTUALIDADE
Christianity Today




CRISTIANISMO INDIVIDUALISTA

O "cavaleiro da fé" individualista e o "herói trágico" altruísta

História do Novo Testamento em Português

Os verdadeiros Depósitos da Fé

Dr. Ernest Findley Scott, um autor esquecido

Da acracia moral do Evangelho (em torno de Gal. 5:1)

Carta ao papa Pio IX (Charles Hodge)


HINOS DO NOVO TESTAMENTO

I. Lucas 1:46-55

II. Lucas 1:68-79


SÍTIOS E BLOGUES NA REDE

Trinity Foundation. Entidade com trabalho (e edição) na boa tradição protestante. Trata-se dos continuadores do Rev. J. Gresham Machen (1881–1936), que insistem em manter acesa a chama de um cristianismo evangélico depurado tanto das idolatrias modernas quanto das antigas. Atenção à secção de livros, que é muito boa, incluindo títulos de Gordon H. Clark (1902-1985, foto de baixo).

Reformation On-Line Igualmente de inspiração calvinista. Contém artigos, informações sobre autores e links para outros sítios.

Center for Reformed Theology and Apologetics. Trata-se de um espaço muito bom, com muitos recursos: documentos históricos da Igreja e uma secção de livros e textos on-line, desde Baxter a J. Gresham Machen. Veja-se, por exemplo o Catecismo Abreviado de Westminster.

Orthodox Presbyterian Church (Estados Unidos da América). Denominação fundada por J. Gresham Machen e a que pertenceu também Gordon H. Clark. A título de exemplo, veja-se um dos documentos da OPC disponíveis on-line: "A Igreja Presbiteriana Ortodoxa e a Maçonaria".

Gordon H. Clark em português neste blogue de Felipe Sabino (Brasil).






IGREJA DE CRISTO EM PORTUGAL

Aliança Evangélica Portuguesa

Exército de Salvação

Igreja Adventista do Sétimo Dia

Igreja Evangélica Metodista Portuguesa

Igreja Evangélica Presbiteriana de Portugal


Igreja Lusitana Católica Apostólica Evangélica

(mais a Liturgia e artigo em inglês)







Sociedade Bíblica de Portugal



O Cristão Individualista testemunha publicamente a sua fé na Igreja Evangélica Lisbonense
(IEMP/IEPP, Região Protestante do Sul).

terça-feira, março 07, 2006

Rótula


Contrariamente a uma opinião recentemente publicada (e que aparentemente se "picou" com isto), determinado ponto de vista tem pernas para andar. Pelo que os problemas de articulação que possa ter se situam nas rótulas. Até porque o tempo tem estado muito húmido na zona de Lisboa...

domingo, março 05, 2006

Caminhos divergentes?


Do meu ponto de vista, os liberais vão por maus caminhos ao escolherem uma destas vias (ou ambas): ocuparem-se demasiado da pequena política e manifestarem demasiado interesse no Estado. Em ambas as coisas, a pequena política e o Estado, os liberais serão irrelevantes e dificilmente serão influentes sem abdicarem do liberalismo.

O recente ensaio de formulação de uma "estratégia" (para implementar que "programa"?) através da invenção de uma "direita liberal" é um modo airoso de disfarçar essa apetência pela pequena política e pelo Estado. Se dissessem que a "estratégia" é influenciar o PSD e o CDS, captando-os para uma agenda concreta, isso seria mais claro e teria a grande vantagem de não enredar o liberalismo numa das heranças mais irracionais e espúrias da politica francesa – a dicotomia esquerda/direita. Que essa dicotomia engole o liberalismo e secundariza aquilo que é realmente importante para os liberais (liberalismo vs. iliberalismo, ou seja, individualismo jurídico e económico vs. todas as formas de colectivismo) parece-me por demais evidente.

Por outro lado, não vejo por que razão uma estratégia de influência sobre o sistema partidário deva excluir o PS e incluir o PSD, tanto mais que, no equilíbrio de forças das últimas décadas em Portugal, o apoio do PS tem sido imprescindível para todas as grandes reformas do Estado – sendo estranho que uma estratégia liberal descure um dos dois grandes partidos do sistema quando esses partidos são ideologicamente iguais, se nos abstrairmos da fantasia de que no nosso país a social-democracia do PSD é em alguma coisa diferente do socialismo democrático do PS (em qualquer país "normal" social-democracia e socialismo democrático são duas formas de dizer a mesma coisa).

Por razões que já expliquei noutra ocasião, uma estratégia de "ruptura" por dentro do actual sistema partidário dificilmente pode passar pelo PS e pelo PSD (e nem mesmo nessa outra estratégia que propus me parece evidente que o termo "direita" tenha qualquer papel a desempenhar).

Pressentindo-se que existe uma passagem da área do estudo e do debate para a intervenção política, não se percebe que "agenda" concreta existe. E isso pode levar o combate político dos liberais a uma mera luta de palavras e de rótulos, que se esboroará ao primeiro contacto com o poder. Quer dizer: reclamar a abertura de um espaço "de direita" para o liberalismo ter uma via aberta na vida política significa exactamente o quê? Que os liberais vão fazer o jogo da "direita" (o que quer que isso seja) para mais tarde – num futuro incerto – terem uma oportunidade não sabe bem de quê? Significa que os liberais vão ter de passar a incluir-se na "direita" (rendendo-se à visão do mundo dos socialistas, que sempre os arrumaram assim entre nós)? Ou que devem alinhar com determinadas forças partidárias (a eleitoralmente mais relevante das quais, o PSD, que até sempre recusou qualquer conotação "direitista")?

Mas, independentemente destes equívocos estratégicos, um problema para mim estrutural da causa liberal em Portugal é o modo de estar e a atitude dos próprios liberais. Isto parece-me estar ligado a um fascínio contraproducente pela luta política e pelo poder e, o que é mais embaraçoso de abordar, aos compromissos sociais e económicos de muitos liberais... com o Estado Social(ista).

De facto, seria muito mais saudável para a presença pública do liberalismo que menos liberais estivessem dependentes de dinheiros públicos (em salários, bolsas e subsídios), já que me parece que a realidade contrária funciona como um poderoso (e silencioso) incentivo à entrada nas tricas próprias do sistema político e na falsa lógica de “ideias” e “valores” da dicotomia esquerda/direita. Não só por os liberais se sentarem assim à “mesa do orçamento” (limitando a sua independência face a um Estado que querem reformar), mas também porque assim são enredados nas sociabilidades da dependência pública (que aprisionam).

Na presença pública de algumas vozes liberais que conseguiram aceder aos media está a tornar-se patente a preferência pelo caminho da “direita liberal”. Facilita-se deste modo o funcionamento habitual dos critérios jornalísticos de arrumação das opiniões em “esquerda” e “direita” – e a aceitação pelos media de liberais para desempenharem esse jogo. Mas é sintomático que seja a ideia da “direita” a passar e o liberalismo a continuar incompreendido.

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sábado, março 04, 2006

The Culture Cult


Por indicação hoje dada por Patrícia Lança, chamo atenção para o site (e o livro) de Roger Sandall, THE CULTURE CULT. Um antropólogo que não se sente obrigado a fazer a promoção folclórica do primitivismo romântico e que com grandes autores, como Mises, reconhece a "grande sociedade" da liberdade civil e do cosmopolitismo cultural como uma conquista de toda a humanidade. Obrigado à Patrícia pela indicação e pelo agradável encontro de hoje. Bem-vinda à Causa Liberal!

quarta-feira, março 01, 2006

Burke em más companhias (malgré lui)...


O Pasquim da Reacção decidiu considerar "protestante" o paraíso intramundano de Marx (aqui) e, vai daí, saca de Burke e de um comentário deste sobre os "protestantes radicais" para reforçar o argumento. Não cabe aqui comentar o disparate que é dizer que a sociedade socialista sonhada por Marx tem algo a ver com o protestantismo (tão disparatado, ou não, quanto dizer que tem a ver com o comunismo monástico que o protestantismo repudiou); cabe, sim lembrar, que invocar o protestante Edmund Burke para zurzir no protestantismo é no mínimo estranho e revelador de grande confusão. É que o dito Pasquim não nomeou protestantes concretos nem denominações, atacou o protestantismo em geral. E, para isso, Burke não serve. Entre outras frases esclarecedoras, este filho de pai protestante e educando de um quaker, escreveu nas "Reflections" esta frase memorável:

WE ARE PROTESTANTS NOT FROM INDIFFERENCE BUT FROM ZEAL.

P.S. Quanto a Voegelin, cuidado com as simplificações. No meio da conhecida interpretação que faz da "revolução puritana", que diz ele do "judicioso (e protestante) Hooker"?

Liberal e voegeliniano



A publicação de uma obra de Eric Voegelin (1901-1985) em Portugal é sempre um grande acontecimento. Acontece que foi recentemente traduzido e publicado o livrinho "Ciência, Política e Gnose", no qual Voegelin aborda os temas já conhecidos dos leitores de "A Nova Ciência da Política" (1952), mas detendo-se nalguns aspectos da sua grande proposta conceptual e analítica sobre a evolução das ideias religiosas e políticas no mundo ocidental. Neste livro merecem-lhe especial atenção Hegel, Marx, Nietzsche e Heidegger e os respectivos papeis naquilo que este grande autor considera, persuasivamente, ser a consolidação de uma vasta deriva neognóstica entre os intelectuais ocidentais – com consequências políticas muito bem explicadas. Em "Ciência, Política e Gnose", Voegelin desenvolve ainda aquele que eu julgo ser, sobre todos, o tema fundamental: a distinção entre ciência e gnose, a primeira assente nas aquisições da filosofia clássica (sobretudo em Aristóteles) e a segunda sendo a pseudo-ciência e a pseudo-filosofia modernas – que foram e são, na realidade, a destruição da filosofia e uma sua substituição por um sistema de crença pretensamente “científico” (no qual Voegelin dá o devido relevo ao papel de Comte).

Esta feliz iniciativa editorial pertence à Ariadne Editora, de Coimbra.

Uma nota: é interessante como a leitura de Voegelin clarifica algumas das justas críticas que o neoaristotélico português Silvestre Pinheiro Ferreira antecipa nas suas "Prelecções Filosóficas" (1813) tanto àquilo que denomina de “seitas filosóficas” alemãs como às pretensões positivistas já claras no seu tempo.


Publicado em L&LP, AP e CL