terça-feira, julho 12, 2005

História do Novo Testamento em Português



[Sobre os primeiros séculos da história do texto do Novo Testamento em Português, algumas notas colhidas em G. L. Santos Ferreira, A Bíblia em Portugal: Apontamentos para uma Monografia, 1495-1850, Lisboa: Livraria Evangélica, 1906.]

A rainha D. Leonor fez imprimir em 1495 tradução do Latim de Vida de Christo de Ludolfo de Saxónia com Mt. completo «interpolado, nos lugares competentes, com as passagens dos de Mc., Lc. e Jo. que naquele não tem correspondência ou lição paralela» (2.ª ed. 1554, segundo cisterciense Fr. Benedicto de S. Bernardo, mas desapareceu posteriormente).

Em 1505, foram impressos os Actos dos Apóstolos e as Epístolas Universais de S. Thiago, S. Pedro, S. João e S. Judas «que do Latim vertera, em tempos mais antigos, Fr. Bernardo de Brivega e se conservavam em manuscrito» (introdução do editor denota preocupação com divulgação das Escrituras entre pessoas que não entendem Latim); ainda em vida de D. Leonor, foi impressa a tradução do jurisconsulto Gonçalo Garcia dos Evangelhos e Epístolas (Inocêncio da Silva, a partir de exemplar mutilado, data-o do fim século XV ou princípio de XVI, mas Santos Ferreira acha-o posterior a 1505 devido a elogio de G. Garcia a iniciativa citada de D. Leonor); mas esta edição seria mera tradução dos Evangelhos e Epístolas do ano a partir do Missal Romano.

Fr. Luís dos Anjos, Jardim de Portugal (Coimbra 1626), refere caso de Victoria Caldeira, que aprendera a ler a Bíblia em Latim a partir de outra “em linguagem”, mas Santos Ferreira pensa que esta seria a Bíblia em versão espanhola de F. E. Driandro (Antuérpia 1543); cerca de 1233, o Concílio Tarragona adoptara a proibição de leitura da Bíblia em “língua vulgar” de Jaime I de Aragão, mas isso foi letra morta até 1564 com publicação da bula Dominici Gregis de Pio IV.

«A primeira tradução regular da Bíblia em Português, foi obra do padre João A. Ferreira de Almeida, ministo pregador do Santo Evangelho em Batávia, segundo rezam os respectivos frontispícios», diz Santos Ferreira, p. 16; relatórios em Der Königlich Dänischen Missionarien aus Ost-Indie eingesandten ausführlichen Bericht (Halle, Saxónia: 1711-26) e obras do Rev. van Troostenburg de Bruijn (De Hervormde Kerk in Nederlandsch Oost-Indie onder de Oost-Indische Compagnie e Biographisch Woodenboek van Oost-Indische Predikanten, Holanda, 1884 e 1893) esclarecem identidade de João Ferreira de Almeida, que traduziu do Espanhol um resumo dos Evangelhos e Epístolas antes dos seus 15 anos: em 1644-5, traduziu todo o Novo Testamento em Português «sobre versão latina de Beza, socorrendo-se às traduções espanhola, francesa e italiana; bem assim a Liturgia e o Catecismo de Heidelberga» (Santos Ferreira, p. 21). Ainda então não conhecia o Grego e o Holandês.

Sobre a 1.ª ed., de 1681, do Novo Testamento de Almeida [O Novo Testamento isto he todos os Sacro Sanctos Livros e Escritos Evangelicos e Apostolicos do Novo Concerto de nosso Fiel Senhor Salvador e Redemptor Iesu Christo Agora traduzidos en Portuguez Pelo Padre João Ferreira A. d’Almeida Ministro Pregador do Sancto Evangelho com todas as Licenças necessarias. Em Amsterdan, por Viuva de J. V. Someren. Anno 1681] (na imagem, o frontispício) diz o padre António Ribeiro dos Santos (Memórias de Literatura Portuguesa, Lisboa: Academia Real das Ciências, 1806, tomo VII): «Trabalhou Almeida esta versão sobre o próprio texto grego, seguindo-o sempre em todos os lugares em que discorda da Vulgata não só na interpretação mas também nos acréscimos, e diminuições, e na mesma transposição de alguns versículos, já nos mesmos capítulos, já de uns para outros, como se acha no texto grego [seguiu versão holandesa de 1637 sobre o texto original do pseudo-sínodo de Drodeck de 1618 e a versão de Cipriano de Valera 1602)]: 1.º encostou-se religiosamente ao texto original, de que não despregou os olhos; 2.º entendendo que em uma obra tão sagrada, como essa, devia sacrificar-se a elegância, e harmonia da locução à fidelidade e exacção dos pensamentos, assentou em rastrear o texto palavra por palavra, trasladando os mesmos termos e expressões, e seguindo o mesmo génio e idiotismo da língua original, quanto lho permitia a clareza e propriedade da nossa língua; 3.º para suprir algumas elipses, e completar em alguns lugares o sentido do texto, tratou de lhe acrescentar as menos palavras que lhe foi possível, distinguindo-se com a diferença dos caracteres itálicos, e demarcando-as com a linha dos parentesis, para que assim facilmente se extremassem das palavras do puro texto; 4.º substituiu algumas vezes aos termos e frases da sua tradução, sinónimos e expressões marginais, que mais servissem a declarar e determinar o sentido do texto; 5.º acrescentou também na margem os lugares paralelos da Escritura; 6.º a cada um dos capítulos pôs a suma das matérias, ou artigos que nele se tratavam» (Op. Cit., pp. 25-6).

Ribeiro dos Santos considerou ainda que esta edição de 1681 tem linguagem “própria e simples”, mas com vocabulário rico, frases e questões gramaticais por vezes afectadas por quebra de familiaridade com o Português europeu, mas também por seguir uma tradução literal do texto grego e acha que Almeida supre bem a falta de um texto grego, ajudando nesse aspecto partes menos precisas da Vulgata.

A 1.ª ed. de 1681 teve mau trabalho tipográfico e muitas gralhas (Almeida publicou em Janeiro de 1683 uma Advertência com correcção de mais de mil erros, ignorada na 2.ª ed.). O prólogo e os sumários por capítulo foram traduzidos da Bíblia holandesa de 1637 e a edição incluía notas marginais com variantes. A 2.ª ed. de Almeida, de 1693, corrompe e desfigura a 1.ª ed. e a 3.ª ed., de 1711, tem linguagem melhorada, mas com erros de revisão, sem sumários e capítulos.

Outras versões em Português: ed. António Pereira de Figueiredo, 1790, a partir da Vulgata, edições oficiais e depois da Sociedade Bíblica (cf. s.v. «Sociedade Bíblica de Portugal», Dicionário de História Religiosa de Portugal, Círculo de Leitores); ed. padre Matos Soares, de 1934, feita a partir da Vulgata; ed. Missionários Capuchinhos, de 1957 (claramente corrigida relativamente ao Textus Receptus a partir do aparato crítico moderno); e ed. Boa Nova, de 1989 da Sociedade Bíblica (cf. s.v. cit.) [ver também (AQUI].

O CRISTÃO INDIVIDUALISTA