Assisti ontem ao "Noites à Direita" no Teatro São Luiz, com António Mega Ferreira, Pedro Mexia e Rui Ramos. O projecto, como está anunciado desde o início ("Noites à Direita – Projecto Liberal"), despertou-me alguma desconfiança, por achar que os liberais não devem perder tempo com as noções de esquerda e de direita, que me parecem incompatíveis – e justapostas – às de liberalismo e iliberalismo. Julgo poder dizer que a noite de ontem confirmou as minhas suspeitas.
Dividir a política em esquerda e direita tem as consequências ontem observadas de ter o fascismo e o comunismo arrumados em campos antagónicos, tal como os liberais, para o efeito separados em "liberais de esquerda" e "liberais de direita". O absurdo foi parcialmente reconhecido pelos oradores, quando disseram que se identificavam mais com os "liberais" do outro lado do que com os "totalitários" do "seu" lado… Ora, o que se pergunta é: então, para que servem as designações de "esquerda" e "direita"?
Acabado de ler um livro de Richard Overy sobre o nazismo e o comunismo estalinista, no qual são patentes as suas enormes semelhanças e a comum rejeição radical do liberalismo, pergunto também: como é possível, perante isso, separá-los por uma linha divisória que divide também o liberalismo? E que semelhanças existem entre "liberais" e "totalitários" de esquerda? Ou "liberais" e "totalitários" de direita?
Os liberais, se o são realmente, deveriam estar preocupados em debater o liberalismo, não a "esquerda" e a "direita". Deveriam, por exemplo, aprofundar a proposta hayekiana de contrapor as tradições do iluminismo anglo-saxónico e do iluminismo continental. Nessa contraposição, muito mais fecunda, descobririam um método muito mais eficaz para clarificar a auto-reflexão de que o liberalismo está precisado. O caminho das "Noites à Direita" só enredará o liberalismo em caminhos que não são os seus.