sexta-feira, julho 29, 2005

Século XX (n.º 46): O ano de 1945


ESTE ANO: Durante a guerra, o agravamento da situação de escassez interna e o recurso à inflação para financiar despesas públicas causaram aumentos de preços e manifestações de descontentamento (onda grevista de 1942-45) que a oposição reviralhista e comunista tentou aproveitar. Mas foi só o descontentamento do funcionalismo civil e militar que criou, em Janeiro deste ano – e de dentro do regime –, um perigo real de golpe de Estado contra Salazar. A 14 de Fevereiro, porém, Salazar concede um aumento salarial de 15% (à custa da emissão fiduciária) e o seu braço direito militar Santos Costa procede a algumas trocas de chefia e tudo se acalma. Após a manifestação de 19 de Maio em seu apoio, Salazar remodela a U.N. e, a 6 de Outubro, convoca eleições para 18 de Novembro, abrindo o acto a listas da oposição. Para tanto, toma uma série de medidas de restabelecimento de garantias individuais e direitos políticos, ocorrendo logo a 8 de Outubro o comício fundador do Movimento de Unidade Democrática (M.U.D.). As adesões reunidas pelo M.U.D., por exemplo com 50 mil subscritores em Lisboa e com um espectro variado de personalidades, criam algum rebuliço e levam a U.N. a tentar mobilizar-se eleitoralmente e o Governo a tomar algumas medidas de contenção das actividades da oposição. Isto foi suficiente para que esta, a 27 de Outubro, suspendesse os seus comícios e viesse a desistir da participação no acto eleitoral. Assim, nas eleições realizadas só com candidatos da U.N. votou a maioria dos eleitores (470 mil em 834 mil inscritos), o que esteve longe de ser uma “vitória” para a oposição. Recolhendo algum do descontentamento causado pelos efeitos económicos da guerra e a percepção que chegou a existir – entre a opinião pública e alguns sectores colaborantes do regime – da iminência de uma transformação política, a oposição estava no entanto bastante dividida (entre um reviralho plural e o P.C.P.) e isolada externamente, já que os anglo-americanos não tinham dúvidas em preferir Salazar à incógnita representada por essa aliança composta essencialmente de comunistas e personalidades do passado. Salazar, seguindo a sua táctica habitual, irá tentar apagar os focos de descontentamento social e fazer a situação política regressar à “normalidade”. (Na fotografia, dirigentes do M.U.D., entre os quais Mário Soares.)

BREVES: --- Luto oficial: A 3 de Maio, o Governo decretou 3 dias de luto pela morte do chefe de Estado alemão, Adolf Hitler. A medida, com alguma lógica para um país neutral e em contra-corrente com o oportunismo aliadófilo já plenamente instalado, causa surpresa em vários sectores, dada a situação militar irremediavelnente perdida da Alemanha. --- Reforço do executivo: A revisão constitucional concedeu ao Governo a capacidade de legislar em situações de «urgência e necessidade pública», consagrando assim o poder legislativo de facto do Governo, que tem crescido em detrimento da Assembleia Nacional. --- Novo rótulo: Por decreto de 22 de Outubro, a P.V.D.E. transforma-se em Polícia Internacional e de Defesa do Estado (P.I.D.E.). As actividades deste corpo de polícia especial passam a estar regulamentados com maior realismo: a lei autoriza agora detenções preventivas “para averiguações” até 180 dias (a lei previa até então apenas 8 dias), no caso dos detidos serem considerados suspeitos de “actividades contra a segurança do Estado”. Os direitos dos detidos continuam, no entanto, muito limitados e sujeitos a arbitrariedades. --- Príncipe da Beira: Na legação portuguesa em Berna nasceu D. Duarte Pio, filho dos Duques de Bragança, que, como primogénito do herdeiro presuntivo da coroa, se torna o primeiro Príncipe da Beira do século XX.

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