sexta-feira, julho 29, 2005

Século XX (n.º 42): O ano de 1941


ESTE ANO: Começa a publicar-se este ano em Coimbra o Novo Cancioneiro, revista literária da corrente neo-realista, a qual resulta da influência do marxismo e das ideias comunistas na literatura (os primeiros manifestos desta corrente já haviam aparecido nos anos 30). Soeiro Pereira Gomes (na fotografia) publica também este ano Esteiros, que ficará como um dos romances emblemáticos da corrente. A abertura das páginas da “velha” revista oposicionista Seara Nova aos neo-realistas é sinal da crescente convivência literária dos grupos republicanos e maçónicos reviralhistas com a nova geração atraída pelo comunismo. O neo-realismo vai desenvolver uma visão da realidade portuguesa extremamente marcada por um idealismo igualitarista que, na sua oposição “ao que está”, deixará de distinguir o “capitalismo” do autoritarismo político vigente no País, criando uma propensão crescente – mesmo no reviralho não comunista – para as soluções económicas socialistas. Assim, o seareiro António Sérgio tornar-se-á o arauto de um “socialismo cooperativo” e todas as proto-formações partidárias da área reviralhista do pós-guerra terão já designações socialistas. Ao longo da década de 40, com variações e nuances, o marxismo tornar-se-á a moeda de troca ideológica de todos os meios oposicionistas portugueses. Isto explicará em grande medida a aceitação consensual da visão histórica do Estado Novo como um “fascismo” (recuperando a posteriori as precoces invectivas “anti-fascistas” de Raul Proença na Seara Nova desde 1926) e a adopção de um dualismo “fascistas” v. “anti-fascistas” que obscurecerá a maior complexidade da história contemporânea portuguesa. Para a historiografia oposicionista, o Estado Novo passará a ser obra de monárquicos, fascistas e católicos (resumindo, “fascistas”) e não o resultado, mais provável, de um longo processo de convergência e acomodação de quase todas as correntes anti-parlamentaristas e anti-liberais com a predominância dos velhos republicanos e da sua mística nacionalista e unitária. A tendência de unidade ideológica do “anti-fascismo” impediu ainda que a oposição se tornasse num meio privilegiado de debate e reflexão sobre as grandes questões nacionais, impossibilitando o florescimento de correntes de reformismo liberal que, quando timidamente surgiram, estavam mais dentro do regime do que fora.

BREVES: --- Sintomático: A 19 de Abril, a Universidade de Oxford atribui a Salazar o grau de doutor honoris causa numa cerimónia realizada em Portugal, na sala do Senado da Universidade de Coimbra. --- Discurso: A 28 de Abril tem lugar no Terreiro do Paço uma manifestação de apoio a Salazar por ocasião do seu 52.º aniversário. Salazar pronuncia então o discurso «Todos não somos demais». --- Entusiastas: A 11 de Junho, a quebra do Pacto Germano-Soviético por Hitler e a invasão da Rússia provoca uma onda de entusiasmo na Legião Portuguesa, tentando “sensibilizar” o neutral e circunspecto chefe do Governo para a “cruzada” anti-comunista dos nazis. --- Não pagamos: Os estudantes universitários de Lisboa e Coimbra iniciam em Novembro uma greve contra o aumento de propinas decretado pelo Governo. Solidarizando-se com a greve, a comissão administrativa da Associação Académica de Coimbra, nomeada pelo Governo em substituição da direcção eleita, decide demitir-se. --- Greve: Os aumentos de preços decorrentes da situação de guerra começam a provocar o aparecimento de focos de descontentamento entre os meios operários. A 27 de Novembro, inicia-se um movimento grevista na indústria têxtil da Covilhã, exigindo aumentos salariais.

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