sexta-feira, julho 29, 2005

Século XX (n.º 37): O ano de 1936


ESTE ANO: Entre Maio e Setembro deste ano ocorreu a fundação de duas organizações miliciais, a Mocidade Portuguesa (M.P., na fotografia, na inauguração do Estádio Nacional) e a Legião Portuguesa (L.P.), que parecem ser inspiradas em organizações do género existentes na Itália fascista e na Alemanha nazi. A M.P. é uma organização obrigatória para a juventude e pretende enquadrar ideologicamente a população escolar dos níveis primário e secundário; a L.P., formada por adultos voluntários, é um corpo paramilitar de apoio ao regime. A formação deste tipo de organizações vinha sendo contrariada por Salazar desde que, em finais de 1933, uma parte do movimento Nacional-Sindicalista rompera com o seu líder (Rolão Preto) e aderira ao Estado Novo. De ideologia fascista, o Nacional-Sindicalismo desenvolvera-se como movimento político e sindical autónomo dentro do sector de apoio à ditadura militar mas opusera-se à Constituição de 1933, por a julgar muito moderada. Essa autonomia e a oscilação do movimento entre a tentativa de colaboração com o regime e a conspiração contra ele, levou Salazar a ilegalizá-lo em Julho de 1934. Mas a eclosão da guerra civil espanhola no Verão deste ano de 1936 veio modificar a relação do regime com o movimento. Salazar acha agora necessário criar alguns instrumentos de enquadramento e combate ideológico mas quer colocá-los sob a alçada do governo. Perante Rolão Preto, que passou à oposição e não desiste de tentar reorganizar o movimento, o chefe do Governo pensa que a melhor forma de controlar os nacionais-sindicalistas é criar instituições que estes possam integrar mas não dirigir. É isto que explica a fundação da M.P. e da L.P., de aparência fascista mas realmente veiculando um ideário de mera lealdade ao Estado Novo. Salazar conseguirá assim desmembrar o Nacional-Sindicalismo e virá a neutralizar a sua influência ideológica e de liderança na M.P. e na L.P. logo que o fim do perigo da guerra em Espanha lhe dê maior margem de manobra para dispensar os elementos fascistas no interior do regime. A M.P. e a sua congénere Mocidade Portuguesa Feminina (M.P.F.) transformar-se-á num género de corpo de escuteiros do Estado incluído no currículo escolar, enquanto a L.P. será colocada sob a vigilância e a chefia de oficiais do Exército. A “fascização” é assim instrumental e passageira.

BREVES: --- Tarrafal: A 23 de Abril é criada a Colónia Penal do Tarrafal, na ilha de Santiago, arquipélago de Cabo Verde. Funcionando até à década de 50, o campo prisional destina-se a receber militantes oposicionistas considerados particularmente perigosos pelo Governo. As condições duras a que os detidos eram sujeitos dar-lhe-á o nome de “campo da morte lenta”. A 29 de Outubro chegam os primeiros prisioneiros, sobretudo anarquistas e comunistas. --- Discurso de Braga: Nas comemorações do décimo aniversário do 28 de Maio, em Braga, Salazar profere o famoso discurso ideológico sobre as “grandes certezas” do Estado Novo (Deus, Pátria, Família, Autoridade e Trabalho). --- Ventos de Espanha: A eclosão a 18 de Julho da rebelião militar em Espanha que dará início a uma guerra civil no país vizinho começa a repercutir-se em Portugal. A 23 de Outubro, Salazar suspende as relações diplomáticas com o governo de Madrid e assume a pasta dos Negócios Estrangeiros depois de discordâncias com o ministro Armindo Monteiro (logo nomeado embaixador em Londres). Enquanto os comunistas tentam estender a Portugal o clima de guerra civil com a rebelião falhada de marinheiros de três navios de guerra (8 de Setembro), Salazar começa a cooperar discretamente com os rebeldes espanhóis.

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