ESTE ANO: A organização, em Abril e Maio deste ano, pela Associação Comercial de Lisboa (A.C.L.), de uma série de debates sobre a temática “Problemas do Pós-Guerra” veio lançar alguma luz sobre o alinhamento dos grupos de interesses organizados relativamente às principais questões políticas e económicas presentes. Realizados (propositadamente?) antes do II Congresso da U.N., reunido a 25 e 26 de Maio, os debates da A.C.L. vieram defender uma linha de maior favorecimento das relações externas da economia portuguesa em detrimento do proteccionismo alfandegário e das concepções autárcicas veiculadas por industriais e lavradores. Foi defendida a ideia de Portugal como «uma nação marítima, comercial e colonizadora» e o fim da reserva dos mercados coloniais à indústria metropolitana, de um modo que faz a A.C.L. inclinar-se para um modelo de integração de Portugal no amplo espaço económico atlântico que os acordos anglo-americanos de Bretton Woods já esboçam. Mas, tal como a indústria e a lavoura, a A.C.L. – sobretudo ligada ao import-export e às colónias – quer atrair investimentos públicos para áreas da sua conveniência (no seu caso, a navegação, os portos, etc.). Esta questão é o principal foco de tensão entre os dois pólos favorecidos pelo actual modelo económico proteccionista, no qual a A.C.L. nunca se encaixou muito bem. Por um lado, os industriais, que querem o aprofundamento do modelo proteccionista e a criação de garantias que reservem ainda mais o mercado nacional e colonial a novas indústrias de capital português, inclinando-se para uma forte intervenção do Estado que lhes dê facilidades de crédito, subsídios e quase ausência de riscos. Por outro lado, a lavoura, que defende o actual equilíbrio, por temer que um aumento da procura de mão-de-obra na indústria conduza ao aumento dos salários agrícolas, pondo em risco a sua rentabilidade a custo conseguida pelo proteccionismo vigente. Perante o equilíbrio actual, a A.C.L. defende a solução mais radical e que menos acolhimento há-de ter do poder, enquanto as reclamações da indústria (que se definem como prioridade “industrialista” dentro do status quo proteccionista) tenderão a ser lentamente acolhidas de um modo que não comprometa repentinamente a lavoura. Estas cedências, sem a alienação do apoio da lavoura, permitirão a Salazar evitar mudanças políticas no regime como aquelas que algumas vozes chegaram a pedir no II Congresso da U.N.
BREVES: --- Greves: Em Fevereiro reacenderam-se as greves rurais no Ribatejo e no Alentejo, instigadas pelo P.C.P. Em Maio, voltam a ocorrer protestos, em Lisboa e Santarém. --- Nome: A 23 de Fevereiro o S.P.N. transforma-se em S.N.I. (Secretariado Nacional de Informação, Cultura Popular e Turismo); António Ferro mantém-se no leme. --- Volfrâmio e Açores: A 5 de Junho, o governo português aceitou, embora contrariado, o embargo da venda de volfrâmio à Alemanha, como lhe era exigido pelos Ingleses desde 1940. Salazar está preocupado com o avanço soviético no Leste e com a destruição total do poder alemão, que se avizinha e pode colocar a maior parte do continente sob o jugo de Moscovo. A 28 de Novembro, as facilidades militares concedidas aos Ingleses nos Açores no ano passado são estendidas aos Estados Unidos. Estas concessões diminuem a tensão acumulada nos últimos anos entre Lisboa e o eixo Londres-Washington (este cessa também a agitação interna por si fomentada para pressionar Salazar, desiludindo os meios oposicionistas). --- Candidatos: Em Junho, inscrito na estratégia definida em 1943, o MUNAF faz divulgar um “programa de emergência do governo provisório” que tem por detrás uma grande expectativa de derrube do Estado Novo ou de partilha forçada do poder após a vitória dos Aliados na Europa. O P.C.P., aliás, prepara-se para a eventualidade dessa “abertura”, formando em Dezembro os Grupos Antifascistas de Combate (G.A.C.), que lhe permitam levar a cabo um assalto “leninista” ao Estado.
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