sexta-feira, julho 29, 2005

Século XX (n.º 48): O ano de 1947


DESTAQUE: A partir de 1947, iniciou-se um período de "normalização" da vida nacional no pós-guerra. Na fotografia, a zona do Campo Pequeno, em Lisboa.

ESTE ANO: Tendo sido poupado às destruições da guerra e gozando de uma situação financeira desafogada (bem diferente da do pós I Guerra Mundial), Portugal é, no entanto, um dos países europeus que adere este ano ao chamado “Plano Marshall”, vindo a receber dos Estados Unidos cinco empréstimos que totalizam 54 milhões de dólares. Estas verbas serviram para criar o Banco de Fomento Nacional, um banco público de investimentos, e foram aplicadas na metrópole (40 milhões) e em Moçambique, iniciando-se a amortização em 1958 (patente no pequeno salto então verificado nos encargos da dívida). O aumento da emissão fiduciária e da dívida pública durante a guerra começou a ser travado este ano e manter-se-á nos próximos anos de modo a regressar-se à estabilização do escudo e das contas públicas. Esta “normalização” da política financeira permite também que o índice de preços estabilize a partir deste ano e, no fundo, se regresse à situação macroeconómica que Salazar criara antes do conflito. Passada a Grande Depressão dos anos 30, é a segunda grande época de crescimento económico que realmente se inicia em Portugal este ano (prolongar-se-á até 1974). Tal como na primeira (o período 1851-1891), o País goza de um sistema monetário estável e de uma situação internacional favorável e em plena afluência, o que lhe permite aproveitar o “empurrão” externo apesar da armadura proteccionista. O País vai, aliás, manter-se ainda afastado durante alguns anos do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio (G.A.T.T.), que sairá das negociações internacionais realizadas este ano em Genebra. No plano interno, mantêm-se as orientações da lei de reconstituição económica, com efeitos até 1950 e só a partir daí substituída pelos Planos de Fomento, que dosearão as concessões progressivas à opção “industrialista” já pedida pelos industriais no final da guerra. Claramente ligadas a essas concessões estão já a remodelação governamental de 4 de Fevereiro deste ano (em que o “industrialista” Daniel Barbosa ocupa a pasta da Economia) e a “promoção” do reformista Marcello Caetano à presidência da comissão executiva da U.N. e depois à presidência da Câmara Corporativa. A saída de Barbosa do governo, em Outubro de 1948, significará apenas que Salazar não estará disposto a sacrificar o rigor orçamental às concessões ao fomento “industrialista”.

BREVES: --- Alguma agitação: Entre Janeiro e Abril ocorrem várias greves coordenadas pelas estruturas clandestinas do P.C.P. e incluídas na estratégia desestabilizadora da oposição; 29 dos dirigentes destas greves serão deportados para o Tarrafal. Novas greves exigindo aumentos salariais surgem em Abril e Julho entre operários da construção civil na região de Lisboa e assalariados rurais no Alentejo. Em finais de Março, as comemorações do dia do estudante são palco para as actividades similares promovidas pelo M.U.D. Juvenil, cuja direcção é então detida. Simultaneamente, dentro dos meios militares, a actividade golpista continua, sendo neutralizada a 10 de Abril mais uma tentativa de derrube palaciano do Governo, envolvendo oficiais de alta patente e com o apoio tácito do próprio presidente da República. --- Demissões: Em Junho, são demitidos pelo Governo vários funcionários públicos apoiantes da oposição, incluindo 26 professores universitários. A oposição manifesta-se num protesto a propósito de um jantar de homenagem a António Sérgio e, em Outubro, o militante comunista e professor universitário saneado Bento de Jesus Caraça denuncia os maus tratamentos dos prisioneiros na colónia penal do Tarrafal. --- Carmona recebe o bastão de marechal: Desde o final da guerra, o presidente adoptou uma posição dúbia entre Salazar e a oposição, chegando a estar envolvido nos golpes preparados pela chamada Junta Militar de Libertação Nacional. Depois de neutralizadas essas acções, Salazar saiu “por cima” concedendo a Carmona o posto honorífico de marechal nas cerimónias do 28 de Maio.

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