segunda-feira, julho 18, 2005

Século XX (I): O ano de 1900


DESTAQUE: Eça de Queirós - Faleceu em Paris no mês de Agosto um dos grandes escritores do século que finda. Homem da “Geração de 70”, cultor do realismo literário e observador mordaz dos costumes portugueses, Eça de Queirós marca com a sua morte o fim de uma época. O velho Portugal do século XIX, irrequieto mas tolerante, periférico mas progressivo, morre de certo modo com ele.

ESTE ANO: A doença de José Luciano de Castro, presidente do conselho de ministros desde as eleições de 1897, acabou por precipitar uma mudança de governo em Julho. Com o governo, mudou também o partido no poder porque a maioria se foi enfraquecendo nas Cortes. É que os partidos são constelações de notáveis com grupos de deputados na sua órbita e não organizações disciplinadas obrigadas a apoiar um governo até ao fim da legislatura. El-Rei, sentido a situação política “madura” para uma alternância, decidiu convidar o líder da oposição a formar um novo gabinete. Como é tradição, as novas eleições fazem-se só alguns meses depois, antes da reabertura das Cortes. O novo chefe do executivo é Hintze Ribeiro, recentemente feito líder do Partido Regenerador. Mas a rotação no poder não esconde a crise que grassa nos partidos políticos portugueses. O grupo de progressistas irrequietos, reunidos em torno de José de Alpoim, prepara-se para pôr em causa a liderança de José Luciano. O Partido Regenerador, agora no poder, passa também por uma crise anunciada. Após a morte de António Serpa, Hintze Ribeiro tornou-se no novo líder dos regeneradores, mas é conhecida a rivalidade que o opõe a João Franco. Este, como Alpoim, não tem feitio para ser número dois no respectivo partido. Para desafiarem os seus líderes, gostam ambos de alinhar com os poucos republicanos eleitos para as Cortes. A grande questão política é saber até que ponto as ambições de Franco e Alpoim vão conduzir a cisões nos dois grandes partidos constitucionais. Essas cisões podem desestruturar o sistema bipartidário português e tornar o pequeno grupo republicano numa peça decisiva da luta partidária nos próximos anos. No princípio do próximo ano, após as eleições para a Câmara dos Deputados, far-se-á uma nomeação de novos membros da Câmara dos Pares para que o Governo tenha a vida facilitada nas duas câmaras das Cortes. É a chamada "fornada", um expediente que serve de há muito para tornar os Pares do Reino numa caixa de ressonância dos Senhores Deputados que, por sua vez, o são do Governo ou de um ou outro “barão” do seu partido. Por mais que se esforce por manter a sua imparcialidade e função constitucional de árbitro político, o Rei vai constantemente correr o perigo de cair nas armadilhas dos políticos e de se ver com um número crescente de inimigos em todos os partidos.

BREVES: --- Morreu António Nobre: O autor de "Só" (1892), de sensibilidade saudosista e nacionalista, deixou em Março o mundo dos vivos. --- Congresso Anticlerical: Realizou-se em Lisboa, em Julho, uma reunião organizada pelos chamados Círios Civis (socialistas). Estes dedicaram-se a falar sobre os modos de combater o que julgam ser a influência excessiva da Igreja Católica. Existem outras organizações, como a Associação do Registo Civil, de sensibilidade republicana, que têm objectivos similares. --- Censo de 1900: Portugal conta, no continente e ilhas adjacentes, 5.423.000 habitantes. Destes, 2.457.000 integram a população activa, que se distribui da seguinte forma: Agricultura, pescas e indústria extractiva 1.567.000; Indústria transformadora, construção e obras públicas e produção de energia e saneamento 448.000; Transportes, comércio, administração pública e defesa e serviços diversos 515.000. As maiores cidades do Reino são Lisboa (356.000 hab.), Porto (168.000), Braga (22.000), Setúbal (19.000), Funchal (17.000) e Coimbra (16.000). Existem só doze cidades com mais de 10 mil habitantes, tendo hoje Lisboa mais 55 mil habitantes que há dez anos e mais 115 mil relativamente a 1878. A taxa de analfabetismo no País ronda os 75%. --- Novo jornal: Começou a ser publicado "O Mundo", jornal republicano fadado a crescente influência política. Existem em Portugal 416 periódicos e ampla liberdade de imprensa.

[Obs.: Na verdade, o século XX começa em 1901, mas, assim, damos-lhe um começo mais "redondo"...]

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