ESTE ANO: É a apresentação da candidatura do general Norton de Matos à presidência da República, em Julho, um verdadeiro desafio para Salazar? A oposição tenta novamente, é certo, a estratégia “unitária”. Quanto ao candidato, apresenta-se como defensor de um processo constituinte que abra caminho a um regime constitucional próximo do da I República, pondo também grande ênfase numa concepção pluricontinental do Estado que os sectores oposicionistas ainda não abandonaram. Mas, por detrás desta aliança presidencial do reviralho e do P.C.P. são já indisfarsáveis as divergências estratégicas internas: uma parte do reviralho, pouco crente em vitórias eleitorais ou nas possibilidades da conjuntura, prefere demarcar-se dos comunistas e “encostar-se” aos sectores “críticos” do regime (quer esperando uma eventual partilha do poder quer novas oportunidades de golpes palacianos como a tentada em 1945). O efeito da guerra fria leva também alguns reviralhistas a terem maiores pruridos de se ligarem e, na verdade, de ficarem organizativamente dependentes de um partido estalinista como o P.C.P. As tentativas grevistas em meios operários e estudantis em 1947 levaram o Governo a utilizar medidas repressivas (prisões, deportações) que desfalcaram ainda mais os meios apoiantes da candidatura e reforçaram a sua real incapacidade de mobilização. Por outro lado, a recuperação económica já patente no ano passado, a descompressão social que a acompanhou e a capacidade de Salazar se fazer aceitar junto de Ingleses e Americanos mostram que o período de perigo para o regime já passou. Em Fevereiro, a cedência aos Estados Unidos do uso da base militar das Lajes (Açores), mediante um acordo entre os dois governos, além de consolidar o alinhamento atlântico de Portugal, é o reconhecimento definitivo de Salazar como parceiro geo-estratégico pela super-potência do hemisfério ocidental. Estes condicionalismos conduzirão Norton de Matos a abandonar (em Fevereiro de 1949) a corrida presidencial contra o outro velho militar republicano, o presidente Óscar Carmona. Deste modo, o chefe do Governo poderá afirmar, com razão, já em Novembro de 1949 – depois da assinatura do Pacto do Atlântico, a 4 de Abril – que «sem nos confinarmos à experiência portuguesa, parece que a solução [pluri]partidária está ultrapassada pelos factos».
BREVES: --- Apoio: A 11 de Janeiro tem lugar uma manifestação de mulheres em apoio a Salazar, agradecendo-lhe a sua acção durante a guerra. --- Acusação: Em Janeiro, familiares do general José Marques Godinho e o seu advogado, Adriano Moreira, são detidos pela polícia depois de terem anunciado publicamente a sua intenção de responsabilizar judicialmente o ministro da Guerra, Santos Costa, de envolvimento na morte do general (que, participando no golpe falhado de 10 de Abril de 1947, falecera na prisão a 24 de Dezembro, vítima de um ataque cardíaco). --- M.U.D. ilegalizado: Em Março, decretando a sua ilegalização, o Governo põe fim às actividades do M.U.D. e detém os membros das suas comissões central e distrital de Lisboa. --- Homenagem: Em Abril, Salazar é alvo de uma homenagem dos docentes da Universidade de Coimbra, que fazem deslocar uma delegação ao palácio de São Bento com esse efeito. --- Católicos e católicos: A 10 de Julho, o Governo manda encerrar o jornal O Trabalhador, órgão da Liga e da Juventude Operárias Católicas (organismos da Acção Católica), dirigido pelo padre Abel Varzim, ex-deputado e apoiante do regime. Este vinha desenvolvendo uma linha de crítica ao regime, que acusava de não estar a implementar a prevista organização corporativa do Estado. Outro sacerdote, Alves Correia, já se destacara como voz crítica, tendo apoiado o M.U.D. em 1945.
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