terça-feira, julho 19, 2005

Século XX (X): O ano de 1909


ESTE ANO: A Universidade tem sido um foco constante de agitação e ainda hoje se vive na “ressaca” da greve de Abril de 1907. Bastou então que o filho de um dos heróis do radicalismo, José Dias Ferreira, fosse reprovado nas suas provas de doutoramento para que alguns estudantes e professores iniciassem uma onda de protestos de evidente conteúdo político. Da mesma forma, mas de sinal político contrário, é lida por certas pessoas a manifestação de estudantes e professores em apoio ao rei D. Manuel II em Junho do ano passado. Tanto entre o seu corpo docente como entre a população estudantil (à volta dos três mil), a Universidade reflecte pois as divisões que atravessam hoje a sociedade portuguesa. É uma instituição antiquada, dispersa mas aberta ao progresso das ideias e dos saberes. Continua sediada em Coimbra com as suas cinco faculdades tradicionais: Teologia, Direito, Medicina, Matemática e Filosofia (nome da faculdade de Ciências). Mas no Porto e sobretudo em Lisboa existe já uma série de institutos e escolas superiores que completam a parte coimbrã e mais antiga da Universidade: a Escola Politécnica, o Instituto de Agronomia e Veterinária, as Escolas Médico-Cirúrgicas, o Curso Superior de Letras, o Instituto de Oftalmologia, os Cursos Superiores de Comércio, as Escolas de Farmácia, as Escolas Naval e do Exército, o Instituto Bacteriológico, o Instituto Central de Higiene. Quem estuda na Universidade são os filhos daqueles que já ocupam na sociedade os lugares da Administração, da Justiça, das profissões liberais. Mas, apesar do seu número reduzido, não é fácil para uma parte crescente deles (sobretudo de Direito) encontrar saídas profissionais, o que explica também o acentuar da turbulência no mundo académico e a radicalização política no seu interior. A Universidade de hoje é, no entanto, um espelho da convivência dos elementos aparentemente mais contraditórios tornada possível por várias décadas de liberdade. Coimbra veste-se de capas pretas e capelos, há ainda um protocolo religioso e a Faculdade de Teologia continua a formar o grupo dirigente do clero. Mas na mesma Universidade dedicam-se aos seus estudos científicos homens como o matemático Gomes Teixeira, o geólogo e paleontólogo Nery Delgado, o naturalista Júlio Henriques, o psiquiatra Júlio de Matos ou o higienista Ricardo Jorge.

BREVES: --- Deslocados em virtude do terramoto no vale do Tejo: A 23 de Abril, a zona do vale do Tejo, junto a Benavente, Salvaterra de Magos e Samora Correia é sacudida por um terramoto que faz mortos e estragos de vulto. Em Portugal, e mesmo às portas de Lisboa, no princípio do século, entre metade e dois terços da população activa vivia de uma agricultura pouco rentável e sobretudo de auto consumo. A indústria e os serviços não cresciam de forma suficientemente rápida para absorver os que queriam deixar os campos. A emigração era a principal alternativa, embora muitos migrassem meramente para as cidades, contribuindo para as tornar ainda mais cheias e instáveis. --- Instabilidade: O governo Campos Henriques não sobreviveu à obstrução da facção regeneradora de Vilhena e a 11 de Abril tomou posse um gabinete chefiado por Sebastião Teles e apoiado em Zé Luciano mas não obteve apoio parlamentar. Os progressistas queriam eleições mas o Rei preferiu outra solução. A 14 de Maio tomou posse um novo governo “extra-partidário” presidido por Venceslau de Lima, que contava com o apoio de Vilhena e Alpoim. Mas, antes do final do ano, a sua maioria frágil esboroou-se e o Rei teve de virar-se novamente para Zé Luciano, convidando o seu número dois, Francisco Veiga Beirão, a formar governo a 22 de Dezembro. --- Congresso Republicano: De 24 a 25 de Abril em Setúbal, os republicanos decidem avançar para uma estratégia insurrecional, apesar de manterem o contacto com Alpoim através de Afonso Costa. Mas os líderes do partido, como Costa e Brito Camacho, estão longe de entender-se. --- Congresso Nacional Operário: Realizado em Lisboa e no Porto a 4 de Julho, saldou-se numa cisão entre apoiantes do Partido Socialista de Azedo Gneco e anarco-sindicalistas. --- Manifestação anticlerical: A 22 de Dezembro, organizada pela maçonaria e encabeçada pelos republicanos Miguel Bombarda, Egas Moniz e Cândido dos Reis, juntou cerca de cem mil pessoas.

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