quinta-feira, julho 21, 2005

Século XX (n.º 25): O ano de 1924


ESTE ANO: A política de estabilização definida por António Maria da Silva (na fotografia) em Dezembro de 1922 pretendia pôr fim à “ditadura” económica da inflação e aos seus perniciosíssimos efeitos a médio e longo prazo. Os governos seguintes não se afastaram muito desta orientação até este ano. Mas a inflação, tendo surgido para financiar as despesas do Estado durante a guerra, tinha de ser substituída ou pelo endividamento ou pelo agravamento dos impostos. Silva recorreu a estas duas alternativas, uma vez que não era possível fazer cortes bruscos nas despesas públicas. O agravamento dos principais impostos directos (contribuição industrial e predial, transacção de capitais) indispôs contra o governo os comerciantes e os industriais, que formam o grosso dos contribuintes. Mas esta política, permitindo uma restrição da emissão de moeda fiduciária, conduziu de facto ao abrandamento da inflação, obrigando também os bancos a praticarem uma política de empréstimos mais restrictiva e responsável. Estes efeitos económicos são muito positivos no médio e longo prazo mas provocam problemas políticos no curto prazo. A indústria habituada pela inflação a viver do crédito bancário vê-se agora na necessidade de liquidar negócios menos viáveis, estando ao mesmo tempo “apertada” pelo aumento dos impostos. Começam a ocorrer dificuldades e falências nos negócios menos viáveis e nas casas bancárias que os haviam sustentado. Entre os assalariados, porém, a travagem da inflação teve efeitos benéficos e assiste-se à súbita desmobilização do movimento operário e do surto grevista. Mas a agitação agora vem doutro lado. Lançada pela Associação Comercial de Lisboa e apoiada no jornal O Século, surge a 28 de Setembro a União dos Interesses Económicos. Junta comerciantes e industriais de todo o País contra o agravamento fiscal e não hesita em promover campanhas de desobediência e prometer intromissão na política partidária. Para minorar esta pressão, o governo fecha os olhos a alguma fuga ao fisco mas isso impede uma maior eficácia da política de equilíbrio orçamental. A crise só será debelada se à estabilização monetária se seguir a retoma do investimento privado e o regresso dos capitais afugentados pela inflação para o estrangeiro. A grande incógnita é se isso vai acontecer num País tão agitado política e socialmente há vários anos.

BREVES: --- Conjuntura política: A queda do governo de Álvaro de Castro e a sua substituição em 6 de Julho pelo democrático Alfredo Rodrigues Gaspar demonstrou a incapacidade dos Nacionalistas assegurarem uma solução política estável. A divisão interna no partido democrático entre os moderados de António Maria da Silva e os radicais (“canhotos”) é cada vez mais clara e um factor crescente de perturbação na vida política. Em 22 de Novembro, o novo governo de José Domingues dos Santos é uma cedência aos radicais do partido. --- Festa da Raça: Realiza-se na semana de 3 a 10 de Junho, dia de Camões, a primeira “Festa da Raça”. A celebração tem o patrocínio oficial e pretende glorificar a nação e a sua história, na tradição republicana das festas cívicas. --- Golpe: A 11 de Agosto é tentado um golpe de esquerda contra a República em que estão envolvidos comunistas. Desde Dezembro de 1919 que existia a chamada Legião Vermelha, uma organização terrorista de inspiração comunista e que levou a cabo vários atentados até Maio de 1925. A 7 de Novembro as comemorações do 7.º aniversário da revolução soviética são impedidas pela Polícia de realizar-se. --- Revista: Iniciou-se a publicação da revista Lusitânia, dirigida por Carolina Michaëlis de Vasconcelos. --- As Avenidas Novas (Lisboa): Nos anos 20, a expansão de Lisboa para norte, iniciada nas últimas décadas da Monarquia, estava em plena consolidação. Da Rotunda ao Campo Pequeno, as classes médias e altas foram-se instalando em prédios e moradias, arredados dos apertados bairros tradicionais da cidade. Esta desconcentração possibilitou uma descompressão social dentro de Lisboa.

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