segunda-feira, julho 18, 2005

Século XX (II): O ano de 1901


ESTE ANO: No Porto, a 17 de Fevereiro, uma jovem chamada Rosa Calmon tentou fugir da alçada da família para ingressar numa casa religiosa. Na ocasião, o seu pai, o cônsul brasileiro na Cidade Invicta, com a ajuda de transeuntes, impediu os cúmplices da filha de a levarem. O incidente gerou uma reacção anticlerical que se estendeu a todo o País, ateando a chama da desconfiança de alguns sectores da opinião pública contra a Igreja Católica e, em particular, contra a sua modesta influência no Ensino. As instalações dos jornais católicos foram particularmente visadas pelas manifestações agressivas que, em Lisboa no princípio de Março, fizeram 21 feridos. A 14 de Abril o Rei, que exprimira simpatia pelos protestos, foi entusiasticamente aclamado na Praça de Touros do Campo Pequeno. Proibidas quase há setenta anos, as ordens religiosas católicas foram-se reinstalando subrepticiamente no País, através sobretudo de escolas. Nestas, sob a capa dos estudos ou das acções caritativas, algumas jovens acabam por fazer votos e viver em comunidade como em autênticos conventos. Tal situação não é muito diferente da das congregações protestantes, também proibidas pelas leis em vigor mas toleradas na prática pelos governos e tribunais. O chefe do Governo, o Sr. Hintze Ribeiro, acha no entanto chegado o momento de regularizar a situação destas instituições católicas. O decreto de 18 de Abril pretende exactamente legalizá-las no caso de provarem a sua de dedicação «à instrução ou beneficência ou à propaganda da fé e civilização no ultramar». Em Outubro, haviam sido legalizadas no Reino 43 casas religiosas. Esta atitude pragmática é asperamente criticada quer pelos republicanos quer pela oposição monárquica, que pretendem ver nela o entreabrir da porta à influência das ordens religiosas na formação das novas gerações. Tal hostilidade explica-se pela difusão das ideias positivistas e nacionalistas que consideram a religião contrária ao progresso e a Igreja de Roma contrária à independência nacional. Este anticlericalismo não mais deixará de ser aproveitado politicamente pelas oposições e cria no Portugal do princípio do século um estranho ambiente: num País nominalmente católico, as ordens religiosas católicas gozam de menos liberdade que em países protestantes como a Inglaterra ou os Estados Unidos.

BREVES: --- Elevador de Santa Justa: Em Junho, foi inaugurado o belo ascensor de ferro fundido que liga a rua do Ouro à colina do Carmo. Tem 45 metros de altura e oito andares decorados em filigrana rendilhada com motivos de inspiração neogótica. Encomendado pela Câmara Municipal, o elevador vem facilitar a circulação na zona central da capital. --- Eléctricos em Lisboa: A Companhia dos Carris de Lisboa, que vinha experimentando modelos de carros movidos a electricidade desde 1887, introduziu um novo serviço de transportes na cidade. Os novos carros, melhorados, estão mais adaptados à geografia acidentada de Lisboa e foram bem acolhidos pelo público. --- Partido Socialista: Esta pequena força política, reunida em torno de Azedo Gneco, realizou em Coimbra a sua 3.ª Conferência Nacional. Bate-se for mudanças políticas radicais mas tende a secundarizar a questão do regime (monarquia ou república); nunca conseguirá fazer o pleno do mundo operário. --- Congresso Colonial Nacional: Inaugurado por S.M. o Rei, definiu as grandes linhas orientadoras para a administração das províncias ultramarinas: manutenção das instituições e chefes indígenas, maior autonomia para os governadores e introdução de legislação separada para africanos e europeus. --- Monopólio confirmado: O velho monopólio do Banco Nacional Utramarino, cujo actual período de concessão expirava este ano, voltou a ser confirmado em Cortes. Esta instituição detém o monopólio da actividade bancária e emissão monetária nas nossas colónias da África ocidental.

Voltar ao Índice.